Jump to content
Forum Cinema em Cena

Katsushiro

Members
  • Posts

    295
  • Joined

  • Last visited

Everything posted by Katsushiro

  1. O que não diminui em absolutamente nada sua importância cultural ou alcance de seu enredo. Espero que Kubrick soubesse disso ao soltar a frase dúbia - do contrário' date=' não passaria de uma constatação imprecisa e tola. [/quote'] acho que kubrick foi equilibrado ao fazer essa colocação. o filme como metonímia parte/todo não serve, realmente. acho que o que ele quis dizer é que como spielberg é um cineasta de tanta importância, deveria ter optado por prioridades e teria um "dever moral" (principalmente sendo judeu) de esclarecer ou contemplar essa chacina que foi a segunda guerra. spielberg falhou nesse sentido e é lamentável. Não, não é. E essa mania de enxergar "deveres" em todo filme que aborda o Holocausto é irritante, vnida de Kubricks e Godards ou não. No Cinema, antes de "deveres", o próprio Cinema. Sempre. Primeiro que as prioridades foram outras, e ele tem esse direito, enquanto artista. Segundo que, pra mim, ele não deixa de fazer isso, nem que seja indiretamente. Terceiro que, de certa forma, é algo tão historicamente enorme que se esclarece já por nome e conceito - o que é ótimo, permite inúmeros olhares. Por esse lado, podemos pegar "O Pianista" e ver que o Polanski não fez "muito" além do que Spielberg. Apenas optou por leitura diferente, mas, pelo seu prisma, teria cometido as mesmas "falhas", embora decida por traços emocionais mais duros e passivos, bem ao estilo do cineasta. Não deixa, porém, de ser tão maravilhoso quanto "A Lista de Schindler", parecidos em algumas porções, distintos em algumas frações. ok. se você gosta dessa abordagem do tema, o problema é seu. agora, não me venha dizer que o filme é SOBRE o HOLOCAUSTO ou SOBRE a SEGUNDA GUERRA, o filme pode se PASSAR na segunda guerra. mas como kubrick disse "é sobre 400 pessoas que se salvaram". como já disse, esse filme é tão ruim quanto um Jarhead, por exemplo, que sendo um dos primeiros filmes sobre a guerra do iraque, aborbou o tema de forma convencional, sem o devido teor político que exigia, demonstrando uma certa covardia por parte do Mendes (quem odeio, só pra constar). Lista de Schindler se finge de grande, mas na verdade é um filme moralista que esconde a verdade (ou se aproveita dela pra vender seu moralismo). perdi 30 pessoas da minha família nessa guerra (sim, sou judeu) e esse filme não me traz emoção (assim como pianista menos ainda... aliás pianista < lista), só angústia e decepção pelo que ele podia ter sido, mas não foi.
  2. Bom, pra mim o filme é imoral (se fosse amoral, seria muito mais interessante, hehe). Mas é imoral, ou seja: dependente da noção reinante de moralismo, só que da pior forma: manipuladora, melodramática. Tanto quanto um Dançando no escuro, por exemplo, apesar do Von Trier achar que se redime pela consciência de imprimir ao filme um tom quase de paródia... Qualquer grande cineasta teria vergonha de filmar aquele final, ou mesmo aquela cena penúltima, quando o Schindler se despede dos judeus que salvou... e quem disse que ninguém seria de filmar o que a segunda guerra foi, desculpe, mas discordo. o uso de microcosmos inteligentes, com um roteiro bem escrito e objetivo (o que esse filme, definitivamente, não tem) conseguiria realizar o macrocosmo da segunda guerra. eu aposto na competência do kubrick pra isso. eu não duvido dele. ele resumiu todo o envolvimento dos humanos/ferramentas (pra que servem, pra onde vão) em 2 horas.
  3. O que não diminui em absolutamente nada sua importância cultural ou alcance de seu enredo. Espero que Kubrick soubesse disso ao soltar a frase dúbia - do contrário' date=' não passaria de uma constatação imprecisa e tola. [/quote'] acho que kubrick foi equilibrado ao fazer essa colocação. o filme como metonímia parte/todo não serve, realmente. acho que o que ele quis dizer é que como spielberg é um cineasta de tanta importância, deveria ter optado por prioridades e teria um "dever moral" (principalmente sendo judeu) de esclarecer ou contemplar essa chacina que foi a segunda guerra. spielberg falhou nesse sentido e é lamentável.
  4. tio kub ixprica: Já vi A Lista de Schindler e esse não é um filme sobre Holocausto; é um filme sobre 400 pessoas que se salvaram dele.
  5. ôpa, só pra avisar que eu consegui me cadastrar, já pedi um filme, e a idéia dos caras é genial. você paga 28 reais, e pode pedir quantos filmes quiser, durante 1 mês. a única restrição é que você tenha apenas 1 filme em casa a cada vez. é ótimo. vou dar preju, com certeza.
  6. o que me dizem?! eu encotrei isso pelo site aqui do Cinema em Cena, lá em cima nos "Anúncios Google". Moro no Rio e ninguém nunca tinha me falado disso. alguém é cadastrado? http://www.netmovies.com.br/
  7. votar no brasil é de duas uma: ufanismo ou piada.
  8. Ok. votei na França. Os meus diretores franceses favoritos. 1 Jean Renoir 2 Robert Bresson 3 Alain Resnais 4 Eric Rohmer 5 Max Ophuls ( se as obras-primas dele são francesas, vale. Além do mais, Ophuls era um expatriado por natureza). 6 Jean Vigo 7 Jackes Becker 8 Jean luc Godard( é suíço, mas todo mundo sabe o que eu quero dizer, não?) 9 Maurice Pialat 10 François Truffaut 11 Marcel Carné ( forcei só pra entrar o Carné, que eu acho que tem obras-primas, mas numa determinada fase; depois decaiu, embora goste de Les tricheurs). É claro que há ainda Rivette, o Duvivier de Carnet de bal e Voici le temps des assassins, Cocteau, Tati, Pagnol, Melville...
  9. Aqui vai uma lista de alguns cineastas que considero essenciais para a História do Cinema. Bem, história com “h” maiúsculo e minúsculo, subjetivo, pois tentei fazer uma média que equalizasse uma suposta importância objetiva e meus gostos pessoais. Não sei se ultrapassou os limites desse tipo de cânone ; provavelmente, sim, mas sem esses caras não se vai muito longe, não. A ordem é aleatória, inclusive em relação à época em que filmaram. Kubrick Eisesntein Dziga Vertov Murnau Erich Von Stroheim Fritz Lang Orson Welles Samuel Fuller John Ford Nicholas Ray Antonioni Valerio Zurlini Rossellini Renoir Bresson Godard Mizogushi Hitchcock Lubitsch que o cinema americano é o mais produtivo (perdendo para o Indiano só. que em qualidade é bem inferior), sim... mas em qualidade... é impossível escolher um. não consigo. Orson Welles e John Ford já me fariam optar pelos Eua, mas excluir Lubitsch e Renoir, não dá. simplesmente não dá.
  10. Revisão de um top Welles, por falar nisso, certa e conclusivamente dos meus três cineastas deuses. 1 Falstaff 2 A Marca da Maldade 3 F for Fake 4 A Dama de Shangai 5 Cidadão Kane 6 Othelo 7 Mcbeth 8 Mr Arkadin De O processo gosto mais ou menos ( a última parte toda é desastrosa, com aquela furibunda e descabida interpretação psicanalítica de Kafka)e Soberba não cito até dizer que vi realmente, isto é: quando a Warner reconstruir a versão wellesiana, provavelmente perdida por esses Brazis e trazer à luz novamente essa obra-prima amputada. Katsushiro2006-8-13 17:6:17
  11. tô com a Beatrixx nessa! ela não quer dizer que você vai achar o filme necessariamente ruim, mas ela cria uma aversão ao filme, justamente por já saber que não se trata do tipo de cinema que ela espera encontrar em um filme. O filme é ruim porque não preenche os pré-requesitos necessários para ser visto. Isso não quer dizer que seja RUIM, quer dizer não digno da atenção dela: ou seja, outro sentido de ruim.
  12. tá faltando muito Welles, Ford e Godard na lista das pessoas aí. vamo correr atrás aê.
  13. acho que peca na auto-explicação. nos últimos segundinhos mesmo... considero-os desnecessários. tudo que havia pra dizer já havia sido dito.
  14. Top 20 Hitchcock. 1 - Vertigo 2 - Rebecca 3 - Intriga Internacional 4 - Disque M para Matar 5 - Sob o Signo de Capricórnio 6 - Janela Indiscreta 7 - Frenesi 8 - Marnie 9 - O Homem que Sabia Demais 10 - Psicose 11 - O Homem Errado 12 - Os Pássaros 13 - A Sombra de uma Dúvida 14 - Pacto Sinistro 15 - Trama Macabra 16 - Topázio 17 - Festim Diabólico 18 - Topázio 19 - Interlúdio 20 - Os 39 Degraus faltam poucos filmes a serem vistos do mestre. mas até agora esses são os melhores mesmo. Psicose é sim um belo filme, mas sua posição (10) é justa pelo seu final, que não é dos que me agradam mais em se tratando de hitchcock.
  15. Você não gostou, Katsushiro? absurdo no melhor sentido da palavra . Sabe se já saiu em DVD? Seria uma boa ver extras sobre o tema. ---------------------------------- SPOILERS -------------------------------------------- ---------------------------------- SPOILERS -------------------------------------------- o dvd de primer não é a resolução definitiva da charada que o filme é. o comentário do diretor, no entanto, ajuda a esclarecer o problema deixando mais evidente certos axiomas cujas derivações você é que tem que se virar para descobrir. a idéia, em poucas palavras (not!), é a seguinte: dois cientistas descobrem um jeito de isolar partículas num ambiente fechado, num movimento periódico entre um ponto e outro. cada partícula faz 12 (ou seriam 13?) viagens antes de voltar à posição inicial, criando um campo de tempo próprio. quando abe entra na máquina, ele sai antes das 13 interpolações, 12 horas antes do abe principal entrar na máquina. abe conta para aaron sobre o teste, mas é um aaron que já é uma cópia de um outro, já que o evil aaron começa a experimentar com a máquina escondido de abe (e da outra cópia de aaron que ele dopou e escondeu no sótão). complicou? que nada! a coisa complica é quando aaron e abe encontram ao acaso com uma terceira pessoa, thomas granger, pai da ex-namorada de abe, e constatam que ele teria descoberto sobre a máquina e a usado, já que ele está com a barba por fazer quando abe o tinha encontrado naquela tarde com a barba recém feita. eles perseguem granger até que ele tenha um derrame (ou algo parecido) e caia duro no chão. como nenhum dos dois tinha contado nada sobre a máquina para ninguém, eles começam a pensar em qual situação uma das suas cópias teria tido que abrir o jogo. abe, nesse momento, não sabe sobre a terceira máquina que aaron está usando para ajustar os últimos dias como ele bem entende. abe dopa a sua cópia e volta no tempo mais uma vez para tentar salvar granger e, fazendo isso, estraga o passado que aaron esteve tentando mudar. aaron, vendo que não tem mais saída, abre o jogo com abe. o dvd tem dois tracks de comentários (um do diretor e ator shane carruth e outro com o restante do cast) e a transferência é boa, sempre levando em conta que o filme foi captado em 16mm e “explodido” para 35, o que dá um certo efeito granulado que se intensifica nas tomadas com menos iluminação. o som é decente para um filme que custou só 7.000 dólares, mas nada de espetacular. é um dos melhores filmes do estilo que eu vi. é inovador porque apresenta um roteiro em forma de problema de lógica, como um desafio. quem quiser assistir um filminho sem compromissos, passe longe. agora, quem gosta de filme que pira o cabeção, primer é must see. Katsushiro2006-7-20 18:53:45
  16. Você não gostou, Katsushiro? absurdo no melhor sentido da palavra .
  17. Alguns filmes para você repensar esta sua afirmação: A Lista de Schindler Forrest Gump Os Suspeitos Razão e Sensibilidade Um Sonho de Liberdade O Sexto Sentido Beleza Americana O Silêncio dos Inocentes O Rei Leão A Bela e a Fera Toy Story O Poderoso Chefão - Parte 3 Os Bons Companheiros Dança Com Lobos Titanic E outros que eu não vi ou não gosto' date=' mas muitos gostam: Fargo Os Imperdoáveis Magnólia Pulp Fiction Traídos pelo Desejo Boogie Nights L.A. - Cidade Proibida A Fraternidade é Vermelha E continua... [/quote'] já se vê daí: a lista dos que essa pessoa não gosta é melhor do que a lista dos que ela gosta. Mas no geral, sim, dos anos 20 pra cá, a década de 90 foi a que menos me chamou atenção, com exceção de alguns filmes que marcaram a história do cinema (mas isso tem em qualquer década).
  18. Persona é meu preferido também. Alguém viu que Saraband (o novo filme dele) só vai sair aqui em DVD vai pular os cinemas. Ele exigiu sala digital...
  19. Katsushiro

    Como Tocar?

    Eu tô querendo conseguir cifras ou tablaturas ou partituras de 3 músicas brasileiras: Som Nosso de Cada Dia - Bicho do Mato Mutantes - Posso perder minha mulher, minha mãe desde que eu tenha o meu rock'n'roll Joelho de Porco - Boeing 723897 são muito difíceis de encontrar em qualquer sistema de busca por modos de tocar músicas comuns. se POR ALGUM milagre de deus, alguém souber tocar ou souber onde encontrar, POR FAVOR, contatem-me. ps: não que eu tenha alguma esperança.
  20. buñuel, revi viridiana ontem: Revendo Viridiana, é fascinante observar como uma obra de arte se enforma ( e transforma) no tempo. O que à primeira vista se contentava com os signos convencionais de uma crítica ( acerba , é verdade), mas unilateral e ideologicamente sacramentada, agora toma os rumos imprevistos de um desvio de rota. A mira de ataque do mestre não é exatamente a caridade, tomada qui como o "estigma" essencial da instituição cristã, mas o seu uso laico, subjetivo. De alguma maneira irônica e não convencional, Buñuel está do lado da instiuição católica. Ele é contra o uso laico, individual, não mediado institucionalmente da benemerência. E por isso mesmo semeia o filme de signos blasfemos, floresta de associações encobridoras e politicamente ambíguas. A mascarada da blasfêmia, saboreada com a ausência de compromissos típica de um humorista, encobre uma mais essencial. A razão da crítica à caridade laica é ditada a Buñuel, assim como ao catolicismo oficial, pelo ceticismo diante das paixões humanas, dos caminhos a que podem conduzir a pobre marionete que fala e morre. Pôr a caridade nas mãos da instituição, mediar sua ação através do exercício dos limites de sua disciplina, é garantir um uso mais objetivo e universal à fé. É depurá-la dos abismos da subjetividade, de seus jogos e engenhos. Ao menos formalmente. Buñuel tem menos de surrealista do que de um moralista na linha de Peres Galdós, Quevedo e qualquer padre da Idade de ouro. Se lhe interessa o olho ácido e atento na promiscuidade entre paixões humanas e objetivos transcendentes é menos na posição de um hedonista anti-clerical que na de alguém que sabe, assim como sempre soube a Igreja, dos limites e misérias humanas. Que sabe que, antes de tudo, é preciso tentar proteger o humano de si mesmo. Viridiana, antes de ser um afresco irônico, gótico e em tom de parábola, é um documento desta postura. E assim igualmente merece ser visto (e revisto). .................................__......................... .............__................................ e pra quem gosta de ler: O ANJO EXTERMINADOR Ontem, revi algumas cenas do filme, e me veio um insight: este filme contém uma metafísica, e isto não é delírio de estudante de Filosofia. A COAÇÃO A QUE OS PERSONAGENS SÃO SUBMETIDOS CORRESPONDE, NA VERDADE,A UMA ABOLIÇÃO DO TEMPO, O EQUIVALENTE A NOSSA CONCEPÇÃO DA ETERNIDADE POST-MORTEM. Buñuel nos dá a dica: o filme é eivado de repetições e lapsos que nos fazem entrever uma vivência circular do tempo, em que o devir ( e seu potencial transformador, aberto para o futuro) está definitivamente abolido. A frase de Letícia que serve como uma espécie de passe encantatório para a cessação do pesadelo é evidente: as combinações múltiplas favorecidas pelo azar os levam a sair da casa, mas não a vontade dos personagens. Assim como na visão cristã da eternidade, não é o homem que dá as cartas, mas o cosmo. Os cristãos inventam um demiurgo supremo que, de seu nicho imperturbável, manipula, a seu bel-prazer, os inefáveis caminhos dos homens. Buñuel, com sua indefectível ironia, elege um deus muito particular:o acaso. Como em Nietzche, o acaso e a necessidade dão-se as mãos, neste complot diabólico, cuja função é destituir a concepção burguesa do mundo, centrada na possibilidade de domínio/controle racional do tempo: o tempo do trabalho e do descanso, da festa e da despedida. Nesta eternidade regida pelo azar, pelo acaso, os tempos se embaralham, e isto pelo recurso de sua espacialização: a coação na sala equivale a uma "geometrização" do contínuo espaço temporal. Isto parece teorema, mas é simples como a aurora: o tempo é marcado, na noção ordinária da temporalidade, por atos metódicos, transcorridos ao longo de uma linha contínua: acordamos, trabalhamos, evacuamos, comemos, vamos a festas, voltamos, morremos. Ora, tudo isto acontece no filme, mas no espaço; os biombos tem esta função. Lá, os personagens satisfazem suas necessidades mais elementares, seu exercício de transcendência ( simbolizado pelo amor de Beatriz e do noivo) e, finalmente, morrem, cumprindo o círculo do tempo ( morte do casal e do doutor). Nesta eternidade infernal, irônica réplica da celestial fantasia burguesa, o tempo é abolido pela literal "espacialização", mas não só: os personagens contribuem para esta supressão do fluxo temporal. O que vemos é um desfile de manias,de repetições,de rituais: estes elementos tem a função de indicar que o tempo está "parado", que a vida se esclerosou, estacionou. A deambulação dos personagens ao longo da sala,deambulação sem rumo, mas movida por uma imperiosa e cega necessidade de deslocamento, indica o círculo vazio desta eternidade espúria. Eles não vão a lugar nenhum, não podem sair; e, no entanto, arrastam-se, morosamente. Executam movimentos reiterados, penteam os cabelos mecanicamente, dizem palavras desconexas; o ritual em si já perdeu o sentido, mas conserva a forma. Buñuel, a fim de denunciar a esterilidade, o caráter estereotipado dos rituais burgueses, tão vazios e espúrios quanto a Eternidade de fachada sob o fundo ( e a ideologia) da qual se deslocam, cria uma espécie de alegoria farsesca, de conto irônico-metafísico. No fundo,se os personagens não podem sair dali, isto não se dá tão somente pela inércia da vontade, o que parece evidente, mas sobretudo pelo fato de que, no fundo, eles se sentem familiarizados com aquele ambiente: a sua amorfa atmosfera, a vacuidade metódica de suas representações, gestos e palavras remete à vida burguesa de todos os dias. Em verdade, estão no ambiente próprio, cotidiano. Mas a couraça da razão, este artifício limitado,que ratifica a idéia convencional de que mantemos o controle sobre os eventos da vida( através do controle das atividades transcorridas no tempo e seu consequënte planejamento) ,por alguma razão misteriosa, foi rompida, e o que restou foi a sombria verdade, oculta por detrás da regularidade dos ritos; o caráter metódico dos mesmos,assim como a idéia de uma eternidade redentora ( na verdade, de um tempo, um devir anulado, cujo ideal é o controle e planejamento burgueses do tempo) na verdade são devedores, em suas distintas manifestações, de um único deus: o deus da Morte, que preside aos festins da inércia burguesa, de sua ausência de vontade e transformação. Buñuel nos desvela, com vários clin d'oeil, que a Eternidade( de que ele nos dá sua versão), o corolário do idealismo, enquanto concepção essencialmente burguesa, nada mais é do que um eufemismo para inércia da vontade, imobilidade da ação, inexistência de um impulso transformador, vivo. Mas sobretudo para esta abertura, constitutiva de toda vida plena ( vide Nitzsche), para os caminhos afortunados do devir, do acaso. Ou seja:o rígido controle do tempo, até a sua completa anulação,de que a noção de eternidade é devedora, são sinônimos de Morte, de valores que renegam a vida. Remeta-mo-nos a Nietzsche e sua crítica dos valores reativos, mesmo quando travestidos de idealismo, de valores cristãos. Na denúncia do conformismo e do caráter retrógrado, repetitivo, neurótico de organização da vida social, Buñuel encontra, nesta metáfora "cósmica e picaresca", um ponto de distância, apartir do qual nosso vícios mais sórdidos são dissecados com a serenidade impassível de um cientista -ou pior, de uma criança- a dissecar um réptil. A imobilidade de seus ritos se volta contra a própria burguesia; o conto de fadas forjado para sustentar o caráter supostamente natural, divino da injustiça, chamado de Eternidade, também.O juízo final está instaurado. ps: Se deu a entender que a principal crítica de Buñuel é de caráter "socialista" ( se é que isto tem algum sentido) esqueçam. O principal ponto de ataque é a mentalidade conformista, uniformizante, estagnada da burguesia, e não a sua situação sócio-histórica. A noção de Eternidade é, digamos assim, a construção depurada, sublime, deste ideal de "negação do devir, da transformação ou, se quiserem, da revolução". Contra-ideal, contra-revolução. O mal do burguês( ou de qualquer outra mentalidade que lhe tome o lugar, proletariada ou não) não é tomar champanhe, mas pugnar pela manutenção de uma ideologia conformista e hipócrita, que tem nos cavalos de batalha da razão a superfície de um processo mais profundo de negação do devir, repito, da mudança. Katsushiro2006-7-8 9:5:33
×
×
  • Create New...