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Forum Cinema em Cena

Akira Kurosawa


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 Visto O IDIOTA

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  Na trama, Kinji Kameda (Masayuki Mori) é um homem que tem sua sentença de fuzilamente revogada segundos antes da execução. Este fato lhe provoca um colapso nervoso que lhe deixa com profundas sequelas psicológicas. Kameda vai para a cidade de Hokkaido para se recuperar, e lá, acaba chamando a atenção de duas mulheres, Taeko Nasu (Setsuko Hara), uma ex- concubina prestes a se casar, e Ayako (Yoshiko Kuga), uma moça de família da região. Mas a grande ingenuidade de Kameda pode coloca-lo em maus lençóis, especialmente no que diz respeito á familia de Ayako, e a Dankishi Akama (Toshiro Mifune), o ciumento noivo de Nasu.

 

 Nesta adaptação de Dostoievski, Kurosawa nos entrega um protagonista que acredita na bondade do ser humano acima de tudo, que ama a todos sem distinção, que não guarda rancor de nada e nem de ninguem. Uma pessoa que enxerga além de qualquer preconceito, e justamente por isso é considerado um idiota por todas as pessoas da região. O filme de Kurosawa mostra como a inocência de Kameda, apesar de cativar até mesmo seus desafetos, não tem vez no mundo cínico e cruel em que vivemos.

 

 Embora seja um bom filme, O IDIOTA sofre com claros problemas de produção, que acabaram por afetar a montagem e o fluxo da história. O cineasta japonês havia idealizado o filme como uma adaptação quase integral do romance de Dostoievski (que não lí). O corte original do filme tinha quatro horas. O estudio detestou esta versão, e fez Kurosawa cortar uma hora e quinze de filme. O resultado é que se nota cenas que foram filmadas as pressas para colar a historia, e intertítulos que surgem em momentos inapropriados para contar ao publico eventos que não vemos. Embora não possa afirmar, acredito que esta parte lesada do filme deveria estar na primeira metade, e talvez por isso, ela soe tão cansativa.

 

 Mas apesar destes defeitos, esta produção de 51 tem muitas virtudes. Como o JACK RYAN comentou ai em cima, Kurosawa sabia compor um plano como ninguém. Destaco aqui o primeiro vislumbre que Kameda tem de Nasu, que nada mais é do que uma fotografia da moça colada em uma vidraça. Um plano que a principio não tem nenhum potencial, mas que o diretor japonês transforma em poesia ao enquadrar o rosto fascinado do protagonista refletido na vitrine ao lado da foto da linda mulher. O uso do 3º plano aqui também e primoroso, ao retratar mais de uma vez os personagens conversando em frente a uma janela, enquanto a neve cai do lado de fora. Uma idéia que poderia parecer repetida, já que é usada mais de uma vez, mas que o diretor usa com sabedoria para dar diferentes significados para cada vez que é utilizada.

 

 Mas acima de tudo, O IDIOTA é um filme de atuação, e como de costume nos trabalhos desse cineasta, os atores estão muito bem dirigidos. Masayuki Mori consegue tornar crivel a ingenuidade do protagonista, chegando a tornar fisica a "idiotice" do personagem sem que isso soe forçado. Setsuko Hara e Toshiro Mifune também tem grande desempenho através do seu casal disfuncional.

 

 Em resumo, O IDIOTA tem um começo cansativo, e não é o trabalho mais coeso de Kurosawa. Mas ainda sim é um belo filme visualmente e narrativamente falando, e merece ser conferido.

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 Visto O ANJO EMBRIAGADO

 

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    Na trama, o Doutor Sanada (Takashi Shimura) é um médico alcóolatra, que certa noite trata a ferida de bala de Matsunaga (Toshiro Mifune) um irascível mafioso a serviço da Yakuza. O médico percebe que o bandido sofre de tuberculose, e tenta convence-lo a iniciar o tratamento. Paralelamente, Okada (Reisaburo Yamamoto) um perigoso criminoso sai da cadeia, pretendendo recuperar o seu antigo posto na organização, ocupado por Matsunaga, além de acertar as contas com a sua esposa, Miyo (Chieko Nakakita) enfermeira do Dr. Sanada.

 

 Embora não seja o primeiro longa metragem de Kurosawa, O ANJO EMBRIAGADO foi o seu primeiro sucesso internacional, e percebe-se claramente o por que. Ainda que a película não de todos os sinais da pericia técnica que o diretor alcançaria posteriormente, o filme já demonstra a excelência da direção de atores do cineasta, além da forma madura com que ele trabalha temas humanistas em torno de uma narrativa de gênero.

 

  O roteiro escrito por Kurosawa em parceria com Keinosuke Uekusa retrata de forma bastante competente o cenário deplorável do Japão pós guerra, com suas periferias insalubres dominadas pela Yakuza. Além disso, a historia constrói uma relação complexa entre Sanada e Matsunaga. Por mais que demonstrem antipatia um pelo outro, é inegável o respeito crescente que o mafioso passa a sentir pelo médico.

 

  Mas o grande mérito do filme está mesmo em suas atuações. Takashi Shimura, colaborador habitual de Kurosawa, representa o Dr. Sanada como um homem constantemente mal humorado, que é bastante direto e incisivo em seus diagnósticos. O seu alcoolismo é retratado de forma discreta, através de suas roupas desalinhadas, e conhecimento profundo do álcool e seus efeitos em seus pacientes.

 

  Porém, o desdém de Sanada em relação as "estupidezes" de seus pacientes, expressada com um forte e recorrente "Hum" ao final de suas frases, escondem um coração enorme, incapaz de negar ajuda a qualquer um. Por mais que o médico mostre nítido desprezo pelo modo de vida de Matsunaga, ele continua a procurar ajuda-lo. E mesmo ocultando o lado simpático de seus pacientes, o bom doutor não deixa de cantarolar uma musica, após a saída de uma jovem paciente que mostra sinais de melhora de sua tuberculose, mesmo tendo permanecido carrancudo durante toda a consulta. Um personagem complexo e encantador representado de forma brilhante por Shimura.

 

 Já Toshiro Mifune, em seu primeiro de muitos trabalhos com Kurosawa, interpreta Matsunaga como um homem que faz questão de mostrar respeito através da violência, e justamente por isso, vive trocando empurrões com Sanada. Mifune constrói muito bem o conflito do personagem, que vê a sua crença no código de honra da Yakuza colidir com a própria natureza humana, afinal, embora os Yakuza preguem que o homem honrado não tema a morte, o criminoso não consegue deixar de sentir medo a medida que sua doença vai progredindo, o tornando cada vez mais fraco, o que Kurosawa faz questão de frisar em uma surreal sequência de pesadelo.

 

  No geral, O ANJO EMBRIAGAO é um ótimo filme, e vale a conferida. Um drama contundente que utiliza a trama envolvendo mafiosos somente como pando de fundo para o que realmente interessa a Akira Kurosawa, que é o humanismo diante da miséria e da marginalidade, segundo Sanada, uma doença ainda mais perigosa que a tuberculose.

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 Visto RAPSÓDIA EM AGOSTO

 

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   Na trama, quando os seus pais viajam para o Havaí para visitar um parente doente, quatro crianças ficam sob os cuidados da avó Kane (Sachiko Murase) que vive em um pequeno vilarejo próximo a Nagasaki. A velha senhora ainda sofre os traumas do terrível dia em que a bomba foi lançada, matando o seu marido e mais incontáveis vítimas. Quando o seu irmão enfermo que vive nos Estados Unidos, lhe escreve pedindo para que ela vá visita-la, Kane hesita, mesmo com os netos tentando convence-la.

 

  RAPSÓDIA EM AGOSTO é um filme um pouco estranho do Kurosawa. A história gira em torno de um tema triste e pesado, especialmente para o povo japonês, que foi o ataque nuclear ao país que marcou o definitivo fim da 2ª Guerra Mundial. Toda a projeção é marcada por um forte sentimento de luto, que acaba contrastando com o ponto de vista em que a história é contada na maior parte do tempo, neste caso, o dos quatro netos da personagem de Sachiko Murase. Isso faz com que mesmo diante de todo o seu caráter melancólico, RAPSÓDIA EM AGOSTO ainda tenha um claro tom lúdico, já que as crianças vão tomando conhecimento de como a bomba atômica afetou a família de Kane através das histórias da velhinha, contadas de forma delicada sim, mas não menos impactante para os seus netos.

 

  O roteiro escrito pelo próprio Kurosawa,  baseado em um romance de Kiyoko Murata trata muito sobre como várias gerações da mesma família encaram a tragédia de Nagasaki. Todos que viveram o horror atômico parecem ter sido marcados pra sempre o ocorrido. Já a geração seguinte (nesse caso os pais das crianças) parecem preferir esquecer o incidente, embora o roteiro maquie isso como puro interesse por parte "Dos Adultos", já que a lembrança do fato poderia macular suas relações com a rica família americana, representada aqui por Richard Gere em uma pequena, mas delicada participação especial como o sobrinho de Kane, que vem para pedir perdão a tia em nome de seu pai (e talvez de seu país?). Mas são nas crianças, é claro, que está a maior representação, já que elas percebem fazer parte de uma geração quase indiferente a tragédia de Nagasaki, que encara o horror nuclear mais como "uma história de terror" do que um fato verdadeiro.

 

  Mas se essas questões se colocam de forma levemente confusa, deve-se bater palmas para a forma extremamente natural e cativante com que o diretor retrata a relação destes quatro netos com a sua avó, seja em momentos mais leves ou nos mais dramáticos. Muito disso se deve ao excelente trabalho de Sachiko Murase, que vive Kane como uma senhora atormentada por seu passado traumático, mas que faz de tudo para que isso não transpareça para os seus amados netos, escondendo a sua melancolia atrás de sua imensa doçura e jeito "caduco".

 

 A parte técnica como de costume é muito bem cuidada pelo cineasta, que compõe muitos de seus planos como se fossem verdadeiras pinturas, como aquele em que Kane conta aos seus netos sobre o "Olho Terrível" que um de seus irmãos desenhava, que nada mais era do que o cogumelo atômico visto entre as duas montanhas que separam o vilarejo de Nagasaki. Kurosawa filma aquelas duas montanhas, de forma que assim como as crianças (e a própria avó) quase podemos imaginar o terrível cogumelo nuclear surgir ali do meio. Outro plano que merece destaque é o belíssimo quadro composto pelo diretor em que vemos a silhueta da avó e dos quatro netos observando a lua. Kurosawa era mesmo um esteta. 

 

 No geral, vale a pena assistir RAPSÓDIA EM AGOSTO. Decididamente não é o melhor do diretor, acho que ele se perdeu um pouco em alguns momentos. Mas  mesmo com o seu tema difícil, consegue ser uma história delicada e tocante, com belíssimas imagens, dignas do mestre japonês.

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