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O Sonho de Cassandra, do Woody Allen


-felipe-
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Assistam e esqueçam os preconceitos, o filme é muito bom. Segue meu longo comentário feito para o blog para quem tiver paciência de ler... 0606

 

Cassandra's Dream

 

Durante

nossa vida, adquirimos alguns conceitos que parecem inatos, dadas as

origens tão profundas e enraizadas no inconsciente. São aquelas

definições que advém de idéias tão básicas que, mesmo em nossos mais

profundos anseios de liberdade intelectual, prevalecem como inalteradas

e qualquer um que defenda o absurdo de suas refutações observará

imediatamente a repugnância a latejar nas veias da face ou no franzir

do sobrolho do ouvinte.

Creio

que nossa herança religiosa (especialmente no Brasil, com o predomínio

dos princípios cristãos como sinalizadores de moral e definidores de

objetivos) seja determinante na construção desses fundamentos básicos.

A

família, por exemplo, bem como sua valorização e status adquirido ao se

tornar chefe de uma é, pois, um atestado de normalidade. E temos que

admitir que uma das coisas que o homem busca em sua existência é não

ser notado por características que o desvalorizem perante o outro - e

na mesma medida, ser valorizado pelo que possui melhor conceitualmente

que a maioria.

Ao

observarmos a perpetuação dessas idéias, nos surpreendemos com a

facilidade da propagação entre crianças, adolescentes (e nessa fase, às

vezes princípios radicalmente opostos aos citados são símbolos de

rebeldia e, por conseguinte, aceitação diante de outros que vivem a

mesma fase), pais e adultos. A família é central em nosso

desenvolvimento, acolhedora diante de nossas fraquezas e fiel às nossas

necessidades (e não se preocupe, o rebelde adolescente descobrirá isso

com o tempo).

Woody

Allen em O Sonho de Cassandra, inicia a estória retratando uma bela

amizade entre dois irmãos, modelo da relação próxima do ideal.

Distantes da perfeição comportamental e totalmente isentos da

expectativa da conduta desejável perante a sociedade diante de

situações difíceis, Allen faz questão de construir uma cumplicidade

inequívoca entre Terry e Ian.

E

ela chega a ponto de desviar os olhares de uma óbvia preferência da

figura paterna pelo inteligente e aparentemente bem sucedido Ian em

relação a Terry, que, ao contrário do despertar da ira, observa tudo

conformado e tímido.

Mas Woody Allen ainda vai além, ao sugerir uma

relação tão complexa, com o intuito de solidificar os princípios que

regem o comportamento familiar dos protagonistas, convida o espectador

a participar de um triângulo, ao, em vários momentos do filme deixar de

apresentar elementos que comprovem a veracidade dos atos e dizeres dos

personagens.

Por exemplo, em vários momentos só sabemos que Terry

ganhou dinheiro nas apostas porque ele fala, e, dadas as circunstâncias

mostradas, mesmo que dificilmente tal fato pareça aceitável, depois de

algumas apostas, o personagem de Farrell demonstra sua sinceridade

falando ao irmão que perdera uma alta quantia monetária e,

consequentemente, ao espectador. Como não ganhar a nossa confiança por

todas as falas anteriores?

O artifício também funciona perfeitamente

quanto a Ian: quando faz a difícil confissão de estar roubando dinheiro

do próprio pai (com surpreendente naturalidade), conferimos um voto

ainda maior de confiança a dupla...simplesmente não há porque

questioná-los.

E

é justamente aqui que todos os efeitos negativos dos arraigados

conceitos começam a aparecer. As dificuldades financeiras de Terry e a

ambição de Ian levam os rapazes a construção de um terceiro vínculo

interpessoal, a ser consolidado com alguém portador do atual objeto de

desejo dos irmãos: o dinheiro.

Munido do domínio dos poderosos

conceitos sociais discutidos e ciente do poder devastador do confronto

com suas incoerências, Tio Howard (e note bem o valor "sanguíneo" do

título sempre vinculado ao personagem) aproveita-se das falhas morais

dos rapazes e de seus seguidos pedidos de dinheiro a fim de adentrar o

universo terrivelmente cruel da discussão de valores sociais

conflitantes e tirar proveito.

Presos em uma encruzilhada na escolha

entre matar um desconhecido para encobrir as evidentes falhas de

caráter do Tio em nome da confiança e da família e perder

definitivamente a importância diante de tal figura (o que representaria

a falência das regras de conduta familiar), eles são direcionados

perspicazmente por Howard a aceitar as condições bizarras do acordo. A

família em primeiro lugar.

No

entanto, o colapso da troca de valores causa uma destruição tão

incrivelmente danosa que, no momento exato do acontecimento (e falo

aqui da cena da chuva, debaixo da árvore, pois considero esse trecho o

deflagrador dos eventos posteriores, que só representam reflexos) já

sabemos que algo terrível advirá, seja através da fragilidade

psicológica de Terry ou do incômodo evidente de Ian.

A

cena do assassinato adentra o universo Hitchcockiano: tensa, belíssima

e elegante, tornando o previsível deliciosamente imprevisível através

da postergação do inevitável. Desde a frustrada tentativa na casa do

pobre homem até os passos apressados, a desconfiança de Martin de estar

sendo seguido na efetiva cena do crime (e, claro, do óbvio, que

aconteceria inevitavelmente) e a cena anterior do encontro imprevisível

da vítima com Farrell no bar. Você chega a roer as unhas...Algo tem que

dar errado...tem que dar...mas não dá.

Uma

vez que a semente da destruição se instala, as alternativas para a

contenção de seu crescimento se tornam ínfimas. E o que emerge dela é o

caos.

Um caos

instantâneo e ansioso, que envolve rapidamente Terry (em uma atuação

estupenda de Farrell, diga-se de passagem), causando uma crise nervosa

intensa e perpétua e, embora menos visível, enfraquece e consome o

ambicioso Ian, gerando uma tensão crescente entre os personagens.

Finalmente quando a cortina desce e o show termina como um estampido seco sobre a mente cansada e desesperançosa do espectador bem como um gosto amargo na boca, de forma extremamente rápida, este último percebe que há mais estória não retratada que retratada no filme.

Não,

não é intenção de Woody satisfazer os anseios psicóticos de quem

acompanha a estória com um banho de sangue e lágrimas, mas dilacerar

nosso cérebro com duas armas infintitamente mais poderosas: a

imaginação e a reflexão.

****/***** 8,1/10 Top 250 #162

Mr. Scofield2008-05-07 18:44:22

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  • 2 weeks later...
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Valeu, Soto. Só tinha dado um tempo mesmo no CeC, mas estava na hora de voltar.

 

Então vc vai adorar Match Point...ou não....06

 

Vou ficar devendo ainda. Nem sei quando vou ver. Mas espero que seja um ótimo filme (pelo que todos falam deve ser), independente de ser melhor ou não que o Cassandra.
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  • 3 weeks later...
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 O Sonho de Cassandra é regular,um noir moderno que consegue prender a atenção,mas tenta ir alem do que pode.Não chega nem perto da tensão alcançada em Mach Point

 

PS.:Neste filme não tem a Scarlet Peituda Johansonsmiley24

 

 

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  • Members

Vi hoje e tbm gostei bastante, não chegaria a dar 5 (uns 4 ou 4,5), mas é realmente muito bom. E o mais surpreendemente, achei a atuação do Colin Farrell ótima!1306 O filme lembra bastante Match Point mesmo (aliás, Allen deve ver uma relação direta entre Londres e assassinatos), mas não acho de forma alguma que um diminua o outro. São ambos bons filmes sobre uma temática semelhante.

 

 

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  • 2 weeks later...
  • Members
Eu acho que faz sentido ele mencionar a ausência de Scarlett.

Allen, tem essa mania de fazer um monte de filmes seguidos com a mesma atriz.

Foi assim com Mia farrow, Diane Keaton... sei lá quem mais... aff!

 

 
[/quote']

 

pois é..e tds essas ai ele pegou..06 sera q com a Scarlett foi a mesma coisa?1917
Jorge Soto2008-06-26 08:56:58
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  • Members

Se a presença da Scarlett fosse algo primordial para o filme, valeria a pena comentar a ausência dela, mas como não é, já que o filme não tem nenhum grande personagem feminino, então não sei pra quê insistir nisso.

 

O Allen usou a Scarlet em 2 filmes e nem acho que ele vai atrás dela de novo...
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  • Members
Ele voltará a trabalhar com ela em Vicky Cristina Barcelona.

 

 

Ok. Ele ainda trabalha com ela.

 

Anyways, na época da Diane e Mia ele não usava as duas em todos filmes dele. Tinha sempre um e outro em que elas não estavam. Acho que o caso da Scarlet é o mesmo.
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  • Members

Sobre essa questão do Match Point: Eu vi o filme e sim acho ele bem melhor que Cassandra, mas não é o caso de comparações. Cassandra pode ter certas fraquezas que não tem a ver com o Match (não dá para se apoiar no Match para justificar qualquer erro do Cassandra). 

 

Entre um e outro, prefiro ficar com os dois. O Allen utiliza um tema em comum, mas de forma bem diferente de um e no outro que, ao meu ver, acrescentou.

 

Caiu tanto pq?

 

Ele deve ter revisto o Match Point... Sei lá. 06
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