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Nacka
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Dook, posso estar errado, mas não sei se Saw é tão ultrahipermega estimado assim. Os críticos, em geral, não gostam nada do filme, vide Rottentomatoes, o próprio Pablo (que deu 3 estrelas apenas) e um montão de gente que eu conheço (você também deve conhecer muitos que não gostam do filme) e é quase um consenso, nenhum deles prefere Saw a Se7en, como eu.
Pra te falar a verdade, eu não dou a mínima pra nenhum deles. 01

[/quote']

 

O público médio considera Saw um filmaço... Vejo poucos aqui no fórum que REALMENTE não gostam do primeiro filme...

 

E aqui no fórum temos isto:

 

Tópico%20%5bsem%20mensagem%20nova%5d

Icone%20da%20Mensagem

Jogos Mortais 4< =smText>
O que esperar deste filme?>
Páginas1 2

maximum

 

O que demonstra que a série não é tão mal vista aqui...

 

Cara, o segundo é muito ruim e o terceiro eu gosto bastante, mas nenhum deles se compara nem em sonhos ao primeiro. 01
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Nossa, parece que a discussão se transformou num "diálogo" entre o Deadman e o Scofa!!!06

 

Bom, entrando na discussão (não sei se vou falar coisas que o Deadman e o Scofa já falaram, pois ainda não li todos os comentários deles): acho o final primoroso, exatamente por que mostra, mesmo sendo uma coisa "fora do planejado" pelo assassino, a capacidade de improvisação do mesmo. O que demonstra que, mesmo ele improvisando, que a "função" dele foi cumprida, e que, com tudo isso, ele será lembrado (o que, em tese, todo serial killer deseja).

 

Além disso, a direção de Fincher é econômica, o que não é de praxe dele (especialmente depois de ter feito "Alien 3"), dando maior vazão para os cenários e o desenvvolvimento dos personagens...

 

E quanto á "comapração" Saw X Se7en: Se7en é muito melhor, mas o primeiro Saw até que é satisfatório...
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E quanto á "comapração" Saw X Se7en: Se7en é muito melhor' date=' mas o primeiro Saw até que é satisfatório...
[/quote']

 

Eu acho que não tem como comparar... Saw choca pela violência enquanto Se7ven choca pelo terror psicológico. Mas a idéia central de "Saw", pelo menos pra mim, foi bem mais original... Na minha humilde opinião...08

 

 

Post 2 de 5 autorizado.

 

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Nossa' date=' parece que a discussão se transformou num "diálogo" entre o Deadman e o Scofa!!!06

 

Bom, entrando na discussão (não sei se vou falar coisas que o Deadman e o Scofa já falaram, pois ainda não li todos os comentários deles): acho o final primoroso, exatamente por que mostra, mesmo sendo uma coisa "fora do planejado" pelo assassino, a capacidade de improvisação do mesmo. O que demonstra que, mesmo ele improvisando, que a "função" dele foi cumprida, e que, com tudo isso, ele será lembrado (o que, em tese, todo serial killer deseja).

 

[/quote']

 

Exato. Na verdade, para mim esse aspecto só ressalta mais a inteligência do personagem do Spacey, que conseguiu se adaptar à nova situação e levar o plano a cabo, mesmo tendo se desviado de seus métodos quando assassinou Tracy. Afinal, em minha visão há tanto mérito (se é que se deve usar essa palavra no caso em questão) em criar um plano perfeito (como, em teoria, o de Jogos Mortais, já que o citaram) quanto em conseguir improvisar frente a uma ocorrência inesperada.

 

E creio que Doe não sentia inveja somente das "pessoas comuns" e sua vida ordinária, feliz ou infeliz; ia muito além disso. Doe invejava aqueles que pecavam sem nenhum remorso, enquanto ele não o conseguia, pelo motivo que o Deadman já expôs, seu moralismo falso e hipócrita. E, dessa maneira, acho muito coerente que as vítimas escolhidas fossem as que mais se "esbaldassem", por assim dizer, no pecado capital correspondente.

 

Assim, o ato de matar seria uma espécie de "libertação" dele do próprio moralismo; afinal, se suas vítimas eram pessoas que pecavam até limites extremos (gula, por exemplo), também ele o fazia, chegando ao ponto de cometer assassinatos tão violentos e sádicos por pura inveja (o que justificaria a sua própria morte, ao final). Aliás, não é significativo que um moralista como John Doe, em sua cruzada contra os "pecados capitais", use tamanha violência? Acho que há um comentário social bem interessante aí... mas talvez seja imaginação minha.
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Nossa' date=' parece que a discussão se transformou num "diálogo" entre o Deadman e o Scofa!!!06

 

Bom, entrando na discussão (não sei se vou falar coisas que o Deadman e o Scofa já falaram, pois ainda não li todos os comentários deles): acho o final primoroso, exatamente por que mostra, mesmo sendo uma coisa "fora do planejado" pelo assassino, a capacidade de improvisação do mesmo. O que demonstra que, mesmo ele improvisando, que a "função" dele foi cumprida, e que, com tudo isso, ele será lembrado (o que, em tese, todo serial killer deseja).

 

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Exato. Na verdade, para mim esse aspecto só ressalta mais a inteligência do personagem do Spacey, que conseguiu se adaptar à nova situação e levar o plano a cabo, mesmo tendo se desviado de seus métodos quando assassinou Tracy. Afinal, em minha visão há tanto mérito (se é que se deve usar essa palavra no caso em questão) em criar um plano perfeito (como, em teoria, o de Jogos Mortais, já que o citaram) quanto em conseguir improvisar frente a uma ocorrência inesperada.

 

E creio que Doe não sentia inveja somente das "pessoas comuns" e sua vida ordinária, feliz ou infeliz; ia muito além disso. Doe invejava aqueles que pecavam sem nenhum remorso, enquanto ele não o conseguia, pelo motivo que o Deadman já expôs, seu moralismo falso e hipócrita. E, dessa maneira, acho muito coerente que as vítimas escolhidas fossem as que mais se "esbaldassem", por assim dizer, no pecado capital correspondente.

 

Assim, o ato de matar seria uma espécie de "libertação" dele do próprio moralismo; afinal, se suas vítimas eram pessoas que pecavam até limites extremos (gula, por exemplo), também ele o fazia, chegando ao ponto de cometer assassinatos tão violentos e sádicos por pura inveja (o que justificaria a sua própria morte, ao final). Aliás, não é significativo que um moralista como John Doe, em sua cruzada contra os "pecados capitais", use tamanha violência? Acho que há um comentário social bem interessante aí... mas talvez seja imaginação minha.

Nonô, sua teoria é muito interessante, assim como a do Deadman e ela só acaba por enfatizar pra mim que o personagem de Spacey deveria ser mais bem explorado na estória sem dúvida alguma.

Dessa forma conheceríamos a teoria que envolve o esqueleto de seu plano de forma a compreender melhor do que ele abriu mão afinal, na improvisação.

Note que a idéia do Noonan é muito boa, mas a idéia da inveja causaria teoricamente uma mudança no plano muito maior que a proposta pelo Deadman. Se Doe invejava os que pecavam sem remorso, enquanto ele não conseguia e as vítimas se esbaldavam no pecado capital correspondente, aí sim temos um motivo ainda mais forte para que a idéia da morte de Tracy se encaixe menos ainda na trama. Ela seria parte de um improviso que subverte a obra e deixa muitas dúvidas do que de fato estamos vendo. Chega a fazer a idéia perder significado. Acho que nada que fosse acessório (mesmo que improvisado) poderia subverter o resultado final "visível" da obra principal (pois ele é o instrumento que promove reflexão em quem vê). O cara quer passar uma mensagem pro mundo...ela deve ser explícita ou ele não conseguirá passar adequadamente. Um fator muito importante: não creio que a idéia de Doe seja deixar interpretações a cargo de quem vê, a mensagem dele deve ser mostrada de forma explícita, óbvia. Está claro aqui que não é. E pra mim não é culpa dele.

Repito mais uma última vez: o problema não é improvisar...o problema é improvisar e manter de forma contundente a idéia inicial. Se o filme permite duvidar da inveja de Doe ou faz inferir um sentimento diferente em relação a David (inveja só ele ou todos os indivíduos simples? Indivíduos simples ou todo mundo que peca sem remorso?), é sinal que há problemas na execução do plano OU no desenvolvimento do personagem (daí a culpa não é dele, mas de quem deixou de por partes que o aprofundassem no filme).

 

Edit: Nonô, retirei a parte que falava de Saw porque não gostaria de fazer aqui no Cineclube uma arena de combate entre os dois filmes. 03

Mr. Scofield2007-02-21 22:09:35

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Note que a idéia do Noonan é muito boa' date=' mas a idéia da inveja causaria teoricamente uma mudança no plano muito maior que a proposta pelo Deadman. Se Doe invejava os que pecavam sem remorso, enquanto ele não conseguia e as vítimas se esbaldavam no pecado capital correspondente, aí sim temos um motivo ainda mais forte para que a idéia da morte de Tracy se encaixe menos ainda na trama. Ela seria parte de um improviso que subverte a obra e deixa muitas dúvidas do que de fato estamos vendo. Chega a fazer a idéia perder significado. Acho que nada que fosse acessório (mesmo que improvisado) poderia subverter o resultado final "visível" da obra principal (pois ele é o instrumento que promove reflexão em quem vê). O cara quer passar uma mensagem pro mundo...ela deve ser explícita ou ele não conseguirá passar adequadamente. Um fator muito importante: não creio que a idéia de Doe seja deixar interpretações a cargo de quem vê, a mensagem dele deve ser mostrada de forma explícita, óbvia. Está claro aqui que não é. E pra mim não é culpa dele.
Repito mais uma última vez: o problema não é improvisar...o problema é improvisar e manter de forma contundente a idéia inicial. Se o filme permite duvidar da inveja de Doe ou faz inferir um sentimento diferente em relação a David (inveja só ele ou todos os indivíduos simples? Indivíduos simples ou todo mundo que peca sem remorso?), é sinal que há problemas na execução do plano OU no desenvolvimento do personagem (daí a culpa não é dele, mas de quem deixou de por partes que o aprofundassem no filme).

[/quote']

 

Mas a obra de Doe foi realmente subvertida, afinal, como dito, ele precisou improvisar porque o cenário repentinamente mudou e saiu do previsto.

 

No entanto, deve-se parar um pouco para pensar sobre a violência. Ela precisa necessariamente ser física para se caracterizar como tal? Claro que não, e aí entra a morte de Tracy. Ela, ao que tudo indica, era um dos poucos fatores que tornavam a vida do personagem de Pitt melhor - além dela, o que ele tinha? Um emprego estressante, morava num lugar péssimo, e assim por diante. Assassinar Tracy (e daquela maneira, ainda por cima) seria a maior violência que Doe poderia cometer contra Mills - muito maior que qualquer tortura física.

 

No entanto, fica claro que o plano original não incluía a morte de Tracy, e aí está a subversão e a improvisação: Doe troca a violência física pela psicológica, por não ter outra saída. E, no fim das contas, é o pior de tudo: Doe foi vencido, por ter sido obrigado a alterar o plano a ponto de quase perder o significado (mas discordo que um observador externo teria dúvidas sobre a mensagem), mas ao mesmo tempo venceu, conseguindo punir todos os pecadores - Mills, que foi o único a permanecer vivo (ao menos até o encerramento do filme), teve a vida destruída e sabe-se lá o estado mental em que pode ter ficado.
Noonan2007-02-21 22:39:55
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Fazendo um resumo aqui: O Scorfa tem problema com o filme porque o John matou a Tracy (e a Tracy não tinha nada a ver com o plano...). É isso?17

Líder da Semana do BBBCeC.

Não, Jail. Esse papel meu, meio que de advogado do diabo (note: eu adoro o filme) se deve a principalmente porque nas épocas de comparação desse filme com Saw, as pessoas falavam que Se7en era perfeito e Saw repleto de falhas. Estou constatando que as idéias que envolvem a trama central de Se7en não são tão perfeitas pra mim quanto o que me falaram seus defensores ferrenhos (e isso não é indireta contra ninguém no fórum...vocês não tem idéia do quanto ouvi falar desses dois filmes na época).
O que me incomoda no filme, basicamente, é que acho que o personagem John Doe não foi desenvolvido de forma satisfatória a ponto de permitir que qualquer idéia que possa ser inferida sobre o plano ou de seu comportamento (que ultrapasse o que seja efetivamente mostrado) seja de fato sólida e isso enfraquece um pouco a trama pra mim. Simplesmente não o conhecemos o suficiente para afirmar muitas coisas com argumentos um pouco mais fortes e explícitos sobre o personagem.

 

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Veja bem: vamos brincar e falar um pouco sobre John Doe. As pessoas aqui, pelo que percebo, o consideram um gênio e a execução do plano é excepcional e mantém a base das características iniciais (a imprevisibilidade não é tão importante assim no final). Mas vamos ver há evidências que Doe seja mesmo um gênio ?
Duas situações, basicamente, no filme PODEM ilustrar que  Doe tem inteligência acima da média, mas, ao mesmo tempo podem significar que não é gênio de forma alguma. (e, portanto, deixa em dúvida se realmente o plano e sua teoria sobre a tal inveja seria tão mirabolantes e engenhosos quanto pensou Noonan ou Deadman ou eles estariam superestimando o personagem).
A princípio...que fator faz com que o assassino não seja identificado rapidamente pela polícia? A ausência de impressões digitais (normal, nada de genioso, o cara simplesmente raspou as pontas dos dedos). O personagem de Freeman (esse sim, mostrado como alguém com traços de genialidade...e isso não quer dizer que não possa ser enganado, claro), rapidamente percebe os padrões que remetem a um serial killer. Encontra pistas e as associa com a idéia contida nos livros (e, não, não acho que o fato de um serial killer se basear em livros mais complexos - e ainda entendê-los de tal maneira - o faça um gênio).
Surpreendentemente chega rapidamente ao assassino porque investiga junto a um contato com o FBI junto a biblioteca a retirada dos livros. E Somerset descobre rápido MESMO, em questão de pouquíssimos dias (veja o tempo transcorrido no filme, que explicitamente ocorre em dias).
Aqui o primeiro sinal: será que um gênio ou alguém tão sofisticado e complexo cometeria um erro bobo desses? Será que ele não investigaria para saber se alguém poderia rastreá-lo facilmente e destruiria esses traços (a biblioteca é informatizada e possui um banco de dados)? Aí vem a desculpa: Ah, mas ele quer ser encontrado e deixa pistas...todo serial killer quer...hmmm...mas será que não estamos confundindo um desejo em ser encontrado com erros REAIS na execução do plano? (e portanto, encontrando justificativas para o que não existe na cabeça do assassino? A resposta é: não sei, porque não conheço de fato o assassino...) Normalmente o assassino quer ser encontrado a partir de suas próprias pistas e não de erros adjacentes. Isso dá o tom a hora em que será encontrado. Ele quer sim..mas na hora em que ELE achar apropriada.
Mais: será que essa subestimação de Somerset não é um erro claro já que possui um histórico muito bom (tanto é que o chefe de polícia insiste em tê-lo no caso), coisa que poderia ser auferida facilmente com...pesquisa?
Aí ele escapa em um golpe de sorte cinematográfico (maravilhoso, claro, mas totalmente cinematográfico...será que o filme é tão "real" assim como diz o Deadman?). Ele não estava em casa mas estava chegando (claro), combate os mocinhos e consegue fugir (aqui um traço interessante: ele não mata David, mas sabemos que ele observa bem seu rosto para usá-lo depois).
Desesperado, ele tem que improvisar..sabe que vai ser pego pela polícia. Qual a forma mais simples de conseguir mais duas mortes (parece razoável que ele queira fechar sua obra morrendo)? Envolver os dois detetives na trama, especialmente o que viu o rosto e portanto, passa a conhecer.
Hmmm...um deles é muito inteligente, mas vive sozinho...o outro vive com...uma esposa...os pecados que faltam são a ira e a inveja.  Não parece nada tão mirabolante assim "plantar" a inveja (seria fake, portanto)  através de um discurso que jamais pode ser provado por nenhuma cena ou circunstância do filme e, portanto, pode sim, ser fake e desencadear a ira (essa última é muito fácil). Matar a mulher não parece uma solução tão fantástica e criativa assim pra mim, embora interessante. Sejamos totalmente honestos..tem um monte de gente aqui que se estivesse na mesma situação, provavelmente pensaria em uma saída assim, talvez até mais interessante...e não somos gênios. Fora que se David telefonasse para a casa antes, correria riscos de descobrir algo (imprevisto que deveria ser considerado por David, afinal o assassino VIU claramente o rosto do policial que o perseguia...deixar a família desprotegida parece um erro primário dele na verdade...mas ele era um bobalhão)
Aí é que tá. Embora sereno e muito confiante, no carro, com UMA frase, Freeman destrói o discurso dele inteiro..."mas você não GOSTA de matar?" Lembram do impacto dessa frase? Ela não tem resposta...ele sai do patamar por um instante. Realmente será que um cara capaz de elaborar uma trama tão inteligente quando a exposta pelo Dead ou pelo Noonan não teria pensado nesse erro grotesco em sua teoria? Embora a situação permaneça sob controle (afinal já estava quase tudo feito), em poucas cenas que aparece percebemos que ele não é "tudo isso". Justamente por isso, é possível de forma muito razoável dizer que ele poderia estar fingindo ter inveja do policial (afinal, não há nada que comprove nada sobre isso), o que diminui e faz o plano parecer forçado no trecho final (segundo essa idéia) e nada brilhante no final das contas. Do mesmo jeito que alguns afirmam que Saw é (cheio de circunstâncias que poderiam dar errado).
Aqui vem a conclusão...se a construção de Doe permite essa interpretação (que sobretudo diminui o poder da trama...daí decorrem vários borrões na obra de arte) e ao mesmo tempo permite interpretações tão geniosas quanto as de Deadman e Noonan, isso pode parecer excepcional, mas por outro lado, pode também escancarar que o personagem não foi bem desenvolvido (há uma linha tênue aqui também). Você enxerga o que quer ver...gosto de ver dos dois ângulos, mas definitivamente os inflamados defensores da "perfeição" de Se7en da minha lista antiga podem penar, pois argumentos para a imperfeição da execução da trama e da construção dos personagens podem ser detectados...se você quiser vê-los. 03

Mr. Scofield2007-02-22 08:18:28
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Scofield, você está querendo impor ao personagem um perfeição que não cabe aqui (pode caber no Saw, mas aqui não tem como).

 

O que eu penso do John é o seguinte:

 

O David Fincher quis lidar com os dois lados dele. Porque, por mais perfeito que seja um serial killer, ele é humano passível de erro.

 

Na maior parte do filme, temos o John Doe, perfeito. Ele se põe como um enviado de Deus, para mostrar o mundo suas imperfeições. Digamos, o lado "Deus" dele. A parte dele que consegue bolar um plano e executá-lo até o fim, sem ser pego, porque está fazendo isso com um propósito maior. Por isso, ele não aparece. Não temos idéia de quem é ele (como Deus, só sabemos que existe, mas ninguém o vê diretamente).

 

Só que, como disse antes, o serial killer John é humano. E a gente só vê esse lado humano dele só no fim, depois que ele caiu na própria armadilha. Não necessariamente a de ter a inveja de um policial (o que faria ele também um pecador como suas vítimas), mas o erro dele foi por um momento renegar sua "natureza divina", de alguém que veio para cá, por um um motivo maior, em troca de ter uma vida "mortal". Ele teria vindo pra esse mundo purificá-lo, mas acabou se contaminando com ele, ao querer ter a vida de um outro humano. E isso só temos ao fim do filme, porque só no fim ele comete esse erro. Só no fim o John cai nessa contradição de "Deus" vs "Homem".

 

São esses dois lados que o Fincher trabalha (e muito bem) no John.

 

É o que eu acho.

 

Líder da Semana do BBBCeC.
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Scofield' date=' você está querendo impor ao personagem um perfeição que não cabe aqui (pode caber no Saw, mas aqui não tem como).[/quote']

 Não, Jail, veja bem...eu não falei de perfeição do personagem (muito menos tentei impor). Falei de uma situação que presenciei (e que, obviamente não tem a ver com vocês) de alguns fãzóides de Se7en falarem que Se7en era perfeito e Saw um lixo (também não é perfeito pra mim, aliás). As pessoas tendem a analisar Saw com um olho crítico supercriterioso e Se7en navega à margem de qualquer coisa, pois é perfeito pra eles. E quis partilhar com vocês porque não acho o filme perfeito...

Quanto a Doe, o que disse foi que o desevolvimento do personagem que é mostrado no filme considero insatisfatório. O post anterior serviu não para defender minha visão do personagem, mas para abordar uma forma menos óbvia de interpretação que é coerente e que ILUSTRA que poderia ser mais bem trabalhado, pois ela pode mostrar uma subversão considerável da idéia principal que todo o público normalmente aclama (que todos consideram uma excelente saída para a problemática) e o pior: é plausível. Note que o que temos aqui são diferentes explicações para o personagem, mas todas ficariam muito mais ricas em detalhes apoiados pela trama explícita no filme e a amplitude de interpretação seria menor se o personagem fosse mais detalhado.

A propósito, sua interpretação é, também, muito interessante. 03

 
Mr. Scofield2007-02-22 13:33:37
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Estou muito satisfeito de ver que as discussões sobre Seven, um filme que aprecio sobretudo por sua plasticidade e construção de ambientes, vão de vento em popa.

 

Sem embargo, é uma pena que tenha sobrado tão pouco espaço para A Lula e a Baleia, que considero um dos dez melhores filmes do ano passado, com um roteiro não menos que excepcional e a melhor interpretação coadjuvante de 2006, do garotinho Owen Kline. Sintam-se convidados a passar na locadora, conhecer essa pequena maravilha que é o filme do Noah Baumbach e, após, ler a resenha feita pelo Vicking com esmero.

 

Aproveitando o ensejo, segue a agenda do Cineclube em Cena, o espaço mais aberto e democrático para discussões sobre a Sétima Arte do fórum CeC, referente aos meses de março, abril e maio. É uma agenda provisória, portanto qualquer impossibilidade de confirmação por parte dos usuários abaixo selecionados deve ser comunicada no tópico ou via MP a este que vos escreve com a maior brevidade possível, para os devidos ajustes.

 <?:namespace prefix = o ns = "urn:schemas-microsoft-com:office:office" />

I Heart Huckabees (by Jailcante) – 5 de março

O Homem Que Não Estava Lá (by ltrhpsm) – 12 de março

Crepúsculo dos Deuses (by Silva) – 19 de março

Submersos (by Mr. Scofield) – 26 de março

Touro Indomável (by The Deadman) – 2 de abril

Blow Up: Depois Daquele Beijo (by Alexei) – 9 de abril

Paradise Now (by Penny Lane) – 16 de abril

Moulin Rouge (by Fernando) – 23 de abril

Casa de Areia e Névoa (by Th@th@ Patty) – 30 de abril

A Criança (by Garami) – 7 de maio

 Herói (by Noonan) – 14 de maio

O Novo Mundo (by J. de Silentio) – 21 de maio

Os Bons Companheiros (by Veras) – 28 de maio

Houve uma pequena mudança na agenda. O filme Lawrence da Arábia foi Substituído por O Homem Que Não Estava Lá, de autoria dos Cohen Brothers. O ltrhpsm continua responsável por essa agradável missão, cujos resultados serão postados na nesta segunda-feira próxima, dia 12 de março, se tudo correr bem.

 

Anjo da Semana no BBBCeC
Número de posts: 10
Post número: 1
Alexei2007-03-07 11:05:44
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Adorei ver que o filme que escolhi sucitou tanta discussão boa' date=' entretanto, gostaria também de saber se a minha crítica agradou, já que ainda sou inexperiente na arte de elaborá-las, enquanto o pessoal daqui é especialista na questão...[/quote']

Julio, eu adorei sua crítica, falei no início da discussão. Comentários muito pertinentes e interessantes.

A idéia era fugir um pouco da obviedade de que era uma ótima crítica - (estava explícito, nem precisava falar) e adentrar as discussões. Sobre sua crítica, tenho que tomar algumas aulas...você apresentou uma visão global e caracterizou o filme escrevendo suas idéias de forma muito clara e sucinta..ao contrário de mim que falo demais e, meu amigo batgody sempre diz que dorme antes de terminar de ler qualquer coisa que escrevo...11060606

Enfim, espero que continue com a gente fazendo críticas e comentando em outras oportunidades e sempre escreva lá no O Que Você anda Vendo e comentando? sobre suas impressões. Aliás,  o que está fazendo aí? Vai ver Below (Submersos!!!) pra me prestigiar em breve!!! 11110606

Mr. Scofield2007-02-23 19:30:48

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Adorei ver que o filme que escolhi sucitou tanta discussão boa' date=' entretanto, gostaria também de saber se a minha crítica agradou, já que ainda sou inexperiente na arte de elaborá-las, enquanto o pessoal daqui é especialista na questão...[/quote']

 

Juliocf, não se subestime!!! Ninguém aqui é especialista nisso, somos apenas pessoas que gostam de expressar os seus sentimentos perante a uma experiência cinematográfica. Sua crítica está muito boa, sucinta e clara!! Assim como o Scofa, espero que você participe mais desse tópico e do "O Que Você Anda Vendo e Comentando". E vá ver também "Crepúsculo dos Deuses" para prestigiar a minha crítica!!!!0506
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Julio, sua crítica ficou ótima sim. Como disse o Silva, foi bem clara e, além disso, deu margem às discussões que vimos por aqui: do seu texto puxou-se o assunto dos cenários/visual acima do desenvolvimento dos personagens, e disso veio o tema das motivações reais de John Doe e as improvisações pelas quais o plano teve que passar.

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Crítica ótima Julio, curiosamente parece que precisei me afastar um pouco do Cineclube para poder aproveitá-lo melhor, cumpri com louvor e gosto, o dever de casa, assisti Se7en sem pressa e com bloco de anotações do lado, melhor que isso só se fosse no cinema:

 

SE7EN – Os Sete Crimes Capitais – David Ficher – A certa altura de Seven o personagem de Morgan Freeman o detetive Willian Somesert diz o seguinte: “Isto não terá um final feliz. É impossível.” Somesert sabe o que diz. O peso de anos de trabalho e a convivência tediosa com policiais limitados cuja a única função é prender bandido sem nunca irem além, fazem de Willian um sujeito blasé, descrente do mundo que o cerca e que mal se limita a levantar a vista com a chegada do novato detetive David Mills (Brad Pitt) à delegacia. Os contrastes são logo delimitados, o que um tem de culto o outro tem de bronco, a meticulosidade e maturidade de Willian em contraponto com a impetuosidade e ar de desorganização de David, compõe o curioso mosaico. <?xml:namespace prefix = o ns = "urn:schemas-microsoft-com:office:office" />

 

Devo dizer que Seven cresceu horrores nesta revisitada, muito mesmo. As citações de Blade Runner e Silêncio dos Inocentes que se tornaram mais evidentes agora e aqui é bom que se diga, não se trata de mera cópia, ou de superação de estilo, Fincher filma com elegância e economia, junto com o diretor de fotografia Darius Khondji, assim como Scott e Demme, usa a cenografia e a luz a seu favor e o resultado é igualmente perturbador.

 

Curiosamente, não há cenas excessivas tão comuns a policiais do gênero em Seven. Quando parece que elas vão acontecer a câmera desvia o olhar e alterna entre as desilusões com o mundo de Willian Somerset ou a vidinha (quase) feliz de David Mills. Note-se a aí, a presença luminosa e triste de Gwyneth Paltrow que com sua Tracy traz um pouco de humanidade à trama, logo após a chegada do casal a Los Angeles, Fincher meio que enxerta uma situação curiosa, Tracy marca um encontro com Willian e se abre com ele, sob o pretexto de não conhecer ninguém na cidade lhe conta algo que acaba por definir a melhor cena do filme. O desfecho trágico conhecido por quem já assistiu o filme ficou mais cruel ali naquela cena. O que poderia ser um anti-climax, para mim que já havia assistido o fílme agora tem uma relevância maior. Doido não?

 

Mas a questão é, o assassino queria ser apanhado? Sim queria, assinatura dele em todos os crimes as pistas inteligentes que deixou, levam a isto, mas não antes do recado ser dado, não antes dele ter certeza que alguém ouvirá o que ele tem a dizer. Doe precisou mudar seu plano original? Sim, ele mudou. E acho que mudou na hora em que fotografa atabalhoadamente o detetive Mills na escada, ali percebeu que tinha material novo nas mãos. E dos bons.

 

Para quem executava meticulosamente seus crimes, planejando detalhes mínimos ele viu diante de si um novo desafio, usar as informações que aparentemente colhia sempre que precisava e sem o conhecimento dos tiras, travestido de fotógrafo-informante, de forma completamente nova, com a própria polícia. O jovem e impetuoso detetive Mills era a chave para completar sua equação macabra, purgar o mundo pela exposição dos sete pecados capitais. A ira estava bem ali na sua frente. Tracy, a doce e emocionalmente frágil esposa abnegada, seria o elo. A cena chave no epílogo do filme, com a câmera fechando no sorriso malévolo no rosto dele e alternando rapidamente com o rosto atônito de Willian, diz que o improviso saiu melhor que o planejado. Muito melhor.  

 

Concordo que o personagem John Doe poderia ser desenvolvido de forma mais abrangente, mas não acho que isso seja uma falha do filme. Quando os dois detetives invadem a casa de Doe percebemos (eles também) que estamos diante de alguém que leva muito a sério o que faz. Os diários (240 cadernos, abarrotados de anotações) me fazem crer que Fincher deixou em aberto as muitas possibilidades que a persona de Doe poderia gerar e o desnudou de forma brilhante, ele “deixa” que conheçamos a intimidade dele, a câmera passeia pelo apartamento do assassino de forma preguiçosa e reveladora. Ninguém o viu cometendo os assassinatos e o grau de dificuldade de cada um dá a entender que o diretor optou por pinçar o interessante, em detrimento do que poderia até ser positivo, mas que com certeza jogaria a duração do filme para umas três horas (ou mais). Material tem e muito. Depois que sobem os créditos (onde só aí se vê o nome do ator Kevin Spacey) não ficamos em dúvida, Se7en atravessa as fronteiras da insanidade.

 

Se7en é tão rico de significados que imaginei até um final diferente. Doe na verdade não matou Tracy, a cabeça na caixa seria um molde de cera (coberta com sangue e com a condição psicológica de Willian no limite, ele não teria percebido) . E aqueles cadernos... putz são 240... imaginaram as atrocidades que estão descritas ali?

 
Nacka2007-03-06 14:11:51
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Pessoal obrigado pelos elogios, eu realmente gostaria muito de ser mais participativo no fórum, mas alguns fatores jogam contra: ainda não tenho PC em casa (eu disse ainda...0606) e portanto acesso a internet do trabalho,fica então mais díficil postar aqui. Mas acompanho sempre vários tópicos inclusive o "o que vc anda vendo e comentando"... Scofa e Silva, estou aguardando suas críticas, vou assistir os filmes de vocês e dar a minha visão ok?

 

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Embriagado de Amor (by Enxak)

 

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Sinopse: Um homem com traumas de infância descobre o grande amor de sua vida, que faz com que ele enfrente mafiosos e tenha que viajar para o Havaí. Dirigido por Paul Thomas Anderson (Magnólia) e com Adam Sandler, Emily Watson e Philip Seymour Hoffman no elenco. (por adorocinema.com.br)


O que eu acho: por fora, um filme com fatos e mais fatos insólitos, de teor muitas vezes constrangedor; outras vezes assustadores, engraçados ou simplesmente incolores, acumulando-se dentro de um grande saco de pesadas placas metálicas, sendo levantado por uma frágil corda, prestes a cair na cabeça do pobre Barry Egan, personagem interpretado de forma surpreendente por Adam Sandler (ele mesmo) nesse curto e introspectivo filme de Paul Thomas Anderson. Por dentro: Um filme sobre a força exercida pelo amor. Filme este que sucedeu “Magnólia”, o que elevaria para a estratosfera as espectativas positivas em torno dele. Afinal, o cara que fez “Magnólia” poderia se superar?

 

Aparentemente pacato e inofensivo,sendo com isso explorado por tudo e por todos durante o filme (desde a infância, pelo que se é passado), Barry Egan trabalha com... É um pequeno empresário que... Bom, ele trabalha dentro de um galpão, com alguns outros caras, e tem uma mesa e um telefone. Com o que Barry trabalha? Deve ser importante (para ele, ao menos), pois ele vai todos os dias de terno e gravata, mas a impressão que ele nos passa é que nem mesmo ele sabe o que está fazendo ali, com aquele paletó e gravata, vendendo aquelas coisas (desentupidores?) e atendendo os telefonemas assustadores de suas irmãs (são 7, cada uma mais sufocante que a outra – no pior sentido da palavra elevado à sétima potência).

Barry sente-se constantemente pressionado, sob eterna vigilância, como se fosse um pequeno hamster batendo com a cabeça contra as paredes, procurando pela portinha que o levasse até a saída, prestes a explodir a qualquer momento, roendo a parede de madeira vagabunda com os dentes e criando um atalho, como na vez em que quebra todo o banheiro de um restaurante (o responsável pela segurança do local pede para que ele se retire, pois viu o estado em que ficou o banheiro; Barry nega que tenha feito aquilo e então o cara pergunta-lhe porque sua mão estaria sangrando e ele suavemente responde “Eu me cortei com minha faca”. (auto-destruição ou defesa?) Igualmente estranho é quando deixam um piano (um pianinho – ou seria um órgão?), na calçada do lugar onde trabalha, depois de um abrupto acidente de carro que parece ensurdecer o silêncio apático de Barry e sua caneca de chá, café, ou sei lá o quê é que ele consegue enxergar por uma tímida luz se espremendo por uma estreita fresta. Porque ele o trouxe para dentro de seu escritório? “I Dont Know”,termo que parece muito bem definir o que Barry sabe, pra valer, até então.

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Depois de muita insistência das irmãs, que o espremem contra a parede sem a menor piedade jogando em sua cara todas as pequenas fraquezas e inseguranças - que elas parecem conhecer muito bem -, Barry vai até certa festa em que todas as irmãs e cunhados se reuniriam. Quando lhe perguntam como está o trabalho, ele se enrola e responde “very food”,quando na verdade queria dizer “very good”, e suas irmãs parecem não ter assunto mais interessante para comentar  a não ser as “peripécias” cometidas por Barry (ou seria “sofridas”?) na infância. Começam a lembrar de uma vez em que ele atirou um martelo contra uma porta de vidro e em como ele ficava furioso quando elas o chamavam de gay. “Você é gay agora, Barry?” “I Dont Know”, ele responde, explodindo depois numa fúria incontrolável que o faz quebrar todas as vidraças da cozinha aos pontapés. Um déja vu? Qual seria o problema de Barry? É isso que ele próprio pergunta a um dos seus cunhados, que ele acreditava poder ajudar, por ser médico (era um dentista, na verdade). Barry não sabe como são as outras pessoas, para assim poder diagnosticar qual é o seu problema. E esse pode ser mesmo um problemão.

No mesmo dia em que o piano é deixado na rua e “adotado” por Barry, sua vidinha inócua começa a tomar forma, cor, sabor e tom. Primeiro, ele conhece uma garota chamada Lena (numa atuação da sempre marcante Emily Watson) que faz com que ele ouça barulhinhos diferentes flutuando em sua cabeça. Antes de Lena, porém,o espaço vazio que era sua existência havia sido “sub-preenchido” por uma idéia um tanto quanto ousada, o que parecia provocar nele uma adrenalina até então desconhecida: aproveitando-se de um furo no regulamento de uma promoção de uma empresa aérea, que dava de presente <?:namespace prefix = st1 ns = "urn:schemas-microsoft-com:office:smarttags" />500 milhas em vôo para cada 10 produtos (código de barra) envolvidos na promoção comprados. Comprando embalagens de pudim, com 4 embalagens cada (um código de barra para cada uma) por 0,99 centavos, Barry conseguiria ganhar muitas milhas, gastando pouco. Começou então a entupir seu escritório com caixas e mais caixas de pudim. Mas para onde Barry viajaria? Fez aquilo pensando no lucro, não na utilidade. Mal sabia que precisava na verdade fugir para bem longe. Havia entrado em uma grande enrascada ao telefonar para um Disk-Sexo e perceber no dia seguinte que o sistema de sexo por telefone com desconhecidas gemendo, roubando de pobres almas solitárias o sustento para si próprias, era na verdade uma camuflagem para uma facção criminosa, que começou a ameaçá-lo frequentemente, pedindo-lhe dinheiro,o que culminou em um assalto violento, em que Barry sai ferido. Não só por fora.

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Pra piorar, Lena vai para o Havaí e, com isso, se vai o norte que haviam dado à sua vida. “Preciso comprar mais pudins”. Essa é a decisão de Barry para tentar resolver os problemas e concretizar soluções que lhe foram oferecidas. Compra muitas, muitas, muitas caixas de pudim mesmo! E vai ao Havaí. Lá, liga para uma das irmãs, amiga de Lena, e pede informações de onde ela poderia estar. Como esperado, sua irmã o enche de perguntas indiscretas às quais Barry não estava muito disposto a se expor, tal qual um garotinho negando a todos e a si mesmo que tinha uma namorada. Possesso pela fúria e fortalecido pelo conforto do amor que sentia por Lena (e talvez pela distância, afinal ele estava no Havaí), Barry dessa vez não curva a cabeça pra baixo e cospe no ouvido dela tudo o que sempre esteve entalado por tanto tempo. Raiva, muita raiva. Aquele intenso exorcismo é quebrado para um tom bem mais ameno quando enfim ele consegue encontrar Lena pelo telefone, num hotel. A ansiedade e euforia, por sentir-se mais independente, é tanta que ele parece não querer desperdiçar mais nenhum momento ou pensamento que lhe passe superficialmente pela cabeça, nenhuma dúvida. “Você tem namorado”? “Há quanto tempo não namora”? “Já foi casada”? “Por quanto tempo”? “Onde nasceu”? Tudo ao mesmo tempo, quase sem dar espaço para resposta, querendo entrar pelo telefone, esgueirar-se pelos fios e pular nos braços dela.

O encontro deles no hotel é épico, lindo, cinematográfico. Barry já não se importava em ser visto “de mãos dadas” com uma garotinha. Não era mais tão frágil. Aquela aparente embriaguez superficial de comédias românticas que o fez ir até o Havaí atrás de sua garota era, talvez, o estado mais sólido ao qual Barry já se submetera. Estavam amando, faziam juras de amor: “Quero morder sua bochecha e mastigá-la...” “Quero amassar o seu rosto com um martelo e esmagá-lo, você é tão linda...” “Quero arrancar seus olhos, comê-los, mastigá-los e chupá-los...”. Estavam amando e faziam juras de amor... Da forma deles. Não de uma forma predefinida pelos roteiristas de comédias românticas. Toma coragem e liga para os mafiosos do Tele-Sexo, deixando recado na secretária eletrônica, dizendo que a agressão foi injusta e que quer o dinheiro de volta. E ao voltarem de viagem são atacados pelos mesmos, de forma ainda mais violenta.

Dotado agora de uma força quase que de herói dos quadrinhos, Barry, armado com um pé de cabra, não hesita em derrubar, um a um, todos os capangas, de forma assustadoramente brutal. Barry já não tinha medo dos valentões da escola. Mas ainda não era maduro o suficiente para entender que mulheres gostam de atenção e deixa Lena sozinha no hospital enquanto vai tentar concluir de uma vez por todas o problema com os sacanas que o roubaram. Agressivo, procura pela garota do Tele-Sexo pelo telefone e pede para ela chamar seu chefe (participação brilhante e hilária de Philip Seymor Hoffman), o qual manda se fuder, atiçando a fúria do grande rei da máfia da pornografia. Com a mesma força com que derruba os seus capangas, consegue nocautear o chefão só afirmando, com toda a sinceridade que aprendeu a ter consigo mesmo nos últimos dias, que era um bom homem, e que tinha uma mulher que o fortalecia, e que eles deviam deixa-lo em paz. Voltando de Utah, pede desculpas a Lena, leva o piano (Arrá! Foi por isso que ele o trouxe pra dentro de casa?) para o apartamento dela e vivem assim felizes para sempre, viajando de aeroporto a aeroporto, graças aos pudins.

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“Embriagado de Amor”,como eu disse lá no início do primeiro parágrafo, é muita coisa acontecendo ao mesmo tempo para, no fim, ser nada mais nada menos que uma história de amor, uma história de exaltação ao amor, de como esse sentimento tão famigerado e por vezes desgastado nas telas do cinema, na TV e até em nossas vidas pode ainda ser apresentado de forma crível, palpável, sem deixar de ser original. Pode não ser o melhor filme de PTA, afinal não é todo dia que se “pare” um “Magnólia”, mas é certamente um excelente filme, dentro da desgastada categoria “comédia romântica” (odeio rótulos). Aliás,esqueci de tocar num ponto interessante: Adam Sandler e sua atuação impecável. Impecável porque, se ele fez o mesmo personagem de sempre em todos os seus filmes, durante toda a sua carreira (O abobado indefeso e amável que conquista as pessoas por ser... abobado,indefeso e amável)? A resposta, acho, é mais simples do que parece: Adam Sandler estava desta vez trabalhando dentro de um contexto favorável a ele, tornando a natureza de seu personagem algo verossímil, pois nos apresentava o mundo da forma como ele a via. A cada corte brusco no andamento de uma cena, por um daqueles barulhinhos incômodos, e da trilha sonora totalmente atuante do filme, dos sustos repentinos e fatos sem muito nexo (aquele acidente de carro nas primeiras cenas fez meu coração pular até a boca) que acontecem no decorrer de sua trajetória, nos deixando tão atônitos quanto ele, a todo momento. Tudo isso, graças à direção, obviamente, sempre tocante e intensa do PTA, um dos grandes caras do cinema desta última década. Fica difícil não se envolver com o filme, não se sentir incomodado, perdido, atordoado, no limite da razão. Assim como acontece quando nos apaixonamos. Ou quando temos a sensação de que estamos, ao menos.

Preste atenção: Nos barulhinhos,nas cores,na iluminação, na trilha sonora... E no pianinho.

Por que não perder: Porque é um filme inspiradíssimo, quase que “conceitual”,como aqueles álbuns psicodélicos de bandas de rock progressivo dos anos 70, onde Adam Sandler brilha como nunca.

O que já se disse: “...É um daqueles filmes que a empatia é tanta que se sente que a história pode acontecer com você assim que subirem os créditos. Não tô falando que é clássico, tô falando que é bonitinho, mas é um genial filme bonitinho. Te deixa meio abobalhado, é verdade, mas quem disse que é ruim ser meio bobo?” Bernardo Krivochein (Zeta Filmes).

 

Amigos do Cineclube, eis a resenha do filme Embriagado de Amor. Com um estilo completamente diferente da que a antecedeu ela aponta ao leitor, de uma maneira tão casual quanto adequada, uma das eternas preocupações do cineasta Paul Thomas Anderson: a transformação de vidas aparentemente vulgares e desimportantes por fatos extraordinários e forças do destino. No entanto, Anderson dá uma folga no estilo altmaniano de cinema-mosaico - que tanto havia influenciado Boogie Nights e Magnólia -, executando Embriagado de Amor (que é de 2002) quase em low profile.

 

Esta resenha, muito feliz em suas figuras de linguagem e em seu viés despojado, indiretamente também mostra que a força do Cineclube está na diversidade de idéias, conteúdos e estilos. E não poderia ser diferente.

 

O filme recebeu críticas diversas, o que não o impediu de conquistar um público fiel. Às suas considerações, colegas.

 

Post grátis semanal autorizado.
Alexei2007-02-26 11:35:44
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Aproveitando o ensejo' date=' segue a agenda do Cineclube em Cena, o espaço mais aberto e democrático para discussões sobre a Sétima Arte do fórum CeC, referente aos meses de março, abril e maio. É uma agenda provisória, portanto qualquer impossibilidade de confirmação por parte dos usuários abaixo selecionados deve ser comunicada no tópico ou via MP a este que vos escreve com a maior brevidade possível, para os devidos ajustes.

 

I Heart Huckabees (by Jailcante) – 5 de março

Lawrence da Arábia (by ltrhpsm) – 12 de março

Crepúsculo dos Deuses (by Silva) – 19 de março

Submersos (by Mr. Scofield) – 26 de março

Touro Indomável (by The Deadman) – 2 de abril

Blow Up: Depois Daquele Beijo (by Alexei) – 9 de abril

Paradise Now (by Penny Lane) – 16 de abril

Moulin Rouge (by Fernando) – 23 de abril

Casa de Areia e Névoa (by Th@th@ Patty) – 30 de abril

A Criança (by Garami) – 7 de maio

 Herói (by Noonan) – 14 de maio

O Novo Mundo (by J. de Silentio) – 21 de maio

Os Bons Companheiros (by Veras) – 28 de maio

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Alexei, aí estão todos os filmes que foram escolhidos pelos usuários para resenha? Estou meio (muito) sumido do fórum e minha participação no Cineclube nunca foi lá tão ativa, mas ainda gostaria de resenhar Encontros e Desencontros.

 

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Caras, ADOREI a crítica do Rodrigo. Um texto com cara e cheiro próprio, daqueles que se reconhece e se destacam à distância. É diferente, definitivamente, de todos os outros do Cineclube, e perigoso também. Parece ter sido escrito com uma mão nas costas, e é preciso coragem para tanto, além da certeza de que, fatalmente, acabará agradando tanto como o contrário. Foi minha leitura mais fácil e dinâmica até aqui, o que não significa ausência de traços de elegância esporádicos como, por exemplo, nesta bonita passagem: "Tudo ao mesmo tempo, quase sem dar espaço para resposta, querendo entrar pelo telefone, esgueirar-se pelos fios e pular nos braços dela." (aliás, adoro esse tipo de linguagem, ativa a imaginação) Dividindo espaço com "palavras pouco ortodoxas" como "arrá!" e "fudeu". Parabéns Enxak, e apareça mais vezes, porra!06

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Muito bom o texto do Enxak. Mesmo se extendendo demais na sinopse, foi muito eficiente em mostrar as sensações que sentia do personagem principal, coisa que eu tbm partilhei quando vi o filme.

 

Eu acho o filme fenomenal, um dos três melhores desta década, e o melhor do PTA: muito mais claro no seu estilo narrativo, ele não abandona as heranças de Altman dos primeiros filmes. Muito mais que uma teia de personagem, é uma teia de acontecimentos. Não só pelos fatos em si, mas pela própria maneira da câmera de acompanhar e se afastar dos personagens, com um respeito considerável. As vezes ela olha com estranhamento para os acontecimentos (como o acidente de carro no início, e o pianinho) semelhante ao dos personagens. A trilha sonora, totalmente desfuncional, que dá aquela sensação de incômodo, e a própria simulação da embriaguez naquelas imagens psicodélicas que aparecem sem mais nem menos.

 

Fora Adam Sandler que está, sem nenhum favor, fenomenal. No todo achei esse filme emocionante, muito subjetivo (o filme é um mergulho nas mazelas do protagonista, e a idealização do encontro no Havaí, como o Enxak bem definiu "cinematográfico" é um dos codinomes para o lirismo desse filme), me tocou de uma maneira, pela identificação da bizarrice das coisas que acontecem.

 

Quem não viu, vá correndo...
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Revisto para o Cineclube - afinal, eu estava sumido destas bandas.

 

Sobre o texto: o Enxak perde um pouco de fôlego em contar muitos trechos, mas fora isso tem um desempenho fenomenal para o tipo de filme que poderia pender para várias vertentes; convicto da sua impressão e de sua forma de organizar os parágrafos e frases. Reconhece-se o autor desde já e, apesar de funcionar para com qualquer leitor, ele não se ateve a muitas gírias e vícios de linguagem. Parabéns, Enxak.

 

Sobre o filme: é estranho, muito estranho. Como conheço pouquíssimo do estilo Robert Altman e não vi mais da carreira do PTA, faço pouco quanto à sua classificação. Mas, o que mais influenciou em mim foi a solidão do Barry em diversos momentos; bateu comigo. Adam Sandler está irrepreensível, tanto diverte como conforta e Philip Seymour Hoffman dá aquela mostra de voracidade e presença. PTA tem controle da câmera e gosto, particularmente, da cena onde sua irmã e Lena vão visitá-lo e várias coisas perturbam-no, devendo explicações, conversando fiado com Lance e fugindo das ligações do disque-sexo.

 

Em suma, um filme que é caprichado e bonito; dá um salto muito grande sobre Barry e suas intra ou inter-relações, com inseguranças, medo, tristeza repentina, auto-desconfiança e tem o quê de subjetividade mencionado pelo rubysun, especialmente na função do piano (teria sido o elo temporal para o relacionamento Lena/Barry começar e solidificar-se?). Só não consigo ficar feliz com aquela chegada de Barry ao hotel de Lena no Havaí e a elevação do romance, sei lá porque não me acostumei bem a beijos felizes em romances. A Trilha sonora é valorizada na medida para o andamento da obra e as pinceladas esquisitas d ecores no decorrer do filme pontuam qualitativamente Embriagado de Amor.
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Meu deus!!! Que susto eu levei... fiquei sem Pc por uma semana e, achando q minha resenha era para o dia 5 de março, como antes havia sido postado, entrei em pânico por talvez não poder entregar um dia antes, como pedido pelo Alexei... rsrsrss... acabei de mandar uma Mp para o mesmo pedindo milões de descupas para todos.. morrendo de vergonha ... ai eu entro no topico e vejo que minha resenha mudou de data.... rsrsrs.. anyway....

 

Adorei  a resenha do Enxac ... fiquei com vontade de ver Punch-Drunk Love .. srsrrsrs....

bjos pra todo e see all later...

 

 

 

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Huckabees – A Vida é uma Comédia (I Heart Huckabees) de David O. Russel (2004), by Jailcante

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SINOPSE: Albert Markovski (Jason Schwartzman) é um poeta de coração mole que decide contratar dois detetives, Bernard (Dustin Hoffman) e Vivian (Lily Tomlin), para investigar três coincidências que, segundo ele, podem ser o segredo da vida. A investigação logo envolve outros clientes da dupla, como o vulnerável bombeiro Tommy Corn (Mark Wahlberg), o executivo de vendas Brad Stand (Jude Law) e a modelo Dawn Campbell (Naomi Watts), que está em crise de identidade. A situação se complica quando a sedutora Caterine Vauban (Isabelle Huppert), inimiga da dupla de detetive, passa a seduzir Albert e Tommy na intenção de que eles passem a ver a vida sob o seu ponto de vista (sinopse na capa do DVD).

 

O QUE EU ACHO: Vou começar falando de uma coincidência pessoal: Recentemente fiz uma lista e uma crítica para um Festival no fórum sobre Alfred Hitchcock. Mas eu também me propus a fazer uma resenha para o Cineclube sobre esse filme Huckabees – A Vida é uma Comédia (I Heart Huckabees, 2004), e nesse filme temos a presença de Tippi Heddren, atriz principal de Os Pássaros (The Birds) que Alfred Hitchcock dirigiu em 1963, e que é justamente o filme que abriu o Festival do Hitch. Porque citei isso? Justamente porque Huckabees trata desse tema: coincidências. Na verdade, esse é o pontapé inicial do filme, que a partir daí tenta tratar de questões existenciais, que qualquer pessoa muitas vezes pode tentar analisar em suas vidas. E ao contrário do que possa parecer, o diretor, David O. Russel resolveu tratar disso não de forma dramática, que inicialmente, seria o mais óbvio por se tratar de um tema difícil, mas sim de uma forma cômica, com bastante humor e um bom humor. Desculpe a outras comédias recentes, mas Huckabees sem muito esforço consegue ser muito engraçado, sem cair no pastelão ou caricatura. Roteiros inteligentes com diálogos bem desenvolvidos também podem fazer rir. E muito, como acontece aqui.

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O personagem principal é Albert Markovsky (Jason Schwartzman). Um cara que já começa o filme questionando a si mesmo e a sua vida no geral, mostrando ser uma pessoa cheia de dúvidas e incertezas (afinal quem não as tem). E sabemos o que ele faz: Ele é um ambientalista que faz parte de uma entidade chamada “Espaços Abertos”. Organização que tenta evitar que o progresso urbano acabe de vez com espaços naturais, como bosques, florestas e campos. Logo no início o vemos defendendo uma rocha perto de uma floresta, recitando um poema, hilário por sinal (You rock, rock!), e uma pequena quantidade de pessoas o observando. Depois disso, Albert fala com um colega de trabalho que vai até uma agência de detetives, já que pretende investigar um cara africano. A cena a seguir é interessante, onde se passa os letreiros do filme, já que o mostra perdido no prédio onde fica a agência, andando em vários corredores, ele se vê num labirinto. Não deixa de ser uma referência ao “labirinto emocional” que vai acontecer com ele no decorrer do filme.

Na agência de detetives, conhecemos Vivian e Bernard Jaffe (Lily Tomlin e Dustin Hoffman), casados, e ambos são os detetives de lá. Eles explicam para Albert como funciona o trabalho deles. Eles se autodenominam “detetives existenciais” e investigam passo a passo a vida da própria pessoa que pediu os serviços para assim descobrir qual seria o motivo de alguma coincidência que tenha acontecido, ou a resposta de alguma dúvida que a pessoa tenha sobre a vida. Segundo a filosofia deles, tudo que acontece no universo tem uma ligação, ou uma conecção. Nada acontece por acaso. Tudo é importante. O exemplo que é usado aqui é o de um lençol. O universo seria um lençol, e cada pessoa, cada evento, cada coisa é uma parte desse lençol. Notamos a maneira que o roteiro simplifica coisas, usando uma linguagem mais simplória, para não cair na armadilha de tentar ser um “filme cabeça demais”, já que não era o objetivo aqui. É o charme do roteiro. As pessoas podem gostar ou não do filme, aprovar ou não as filosofias apresentadas aqui, mas entender, elas entendem. O filme dá as ferramentas para isso. Voltando ao caso de Albert, ele foi à agência ansiando uma resposta para uma coincidência que aconteceu em sua vida: Em três momentos distintos ele viu um cara africano. Querendo saber se isso significava alguma coisa, ou seria algum tipo de sinal para algo maior, ele acaba comprando a idéia dos detetives, e com isso a investigação começa.

 

Como poderia acontecer com qualquer pessoa, a investigação dos detetives deixa Albert meio incomodado, já que eles ficam o tempo todo observando e anotando o que ele faz e como ele faz as coisas, o seguindo a cada instante, já que segundo Vivian qualquer pequeno detalhe “pode ser a chave para sua realidade”. Mas incomodo maior é na hora do trabalho. Ele está num momento delicado enfrentando muitas dificuldades. Curioso é essa teia que se monta em volta de Albert: Por causa das dificuldades no trabalho, ele começa a se questionar e questionar a própria razão de sua existência. Esse questionamento o faz prestar atenção nas coincidências principalmente a que envolveu o cara africano, que ele atribui a algum tipo sinal, e em busca desse sinal, ele vai atrás dos detetives. E os detetives acabam por representar a busca dele por uma “verdade universal”. Mas quando os detetives, querendo investigar mais sobre ele, invadem o espaço do trabalho dele, complicando mais as coisas, ele acaba os rejeitando. Ou seja, o trabalho dele acaba sendo o que o atrai e o que o afasta pela busca dessa verdade, que

ele tanto ansiava.

 

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Falando nas dificuldades no trabalho de Albert, o filme direciona à Brad Stand (Jude Law). Ele é um dos diretores de uma rede de shoppings conhecida como Huckabees (que dá nome ao filme). Os dois entram num atrito porque a empresa quer construir mais um shopping numa área de defesa ambiental, defendida pela organização Espaços Abertos. Ambos têm uma intenção nessa negociação: Albert, além de querer defender o espaço natural, quer mostrar mais seu trabalho como poeta, ser reconhecido mais como tal, e quer usar os recursos de marketing da Huckabees para isso; enquanto Brad quer subir mais nos degraus da empresa através dessa negociação. O filme já mostra Albert como tendo uma obsessão contra Brad, já que considera esse o responsável por tudo na sua vida estar dando errado. E isso se mostra ser verdade, já que Brad acaba tomando o espaço dele dentro dos Espaços Abertos, e anulando suas intenções dentro da negociação com a Huckabees. E quando este descobre que Albert estava sofrendo de uma investigação existencial, resolve ir atrás de Vivian e Bernard parar fazer uma investigação pra ele próprio e sabotar os planos de Albert.

 

Outros personagens importantes e muito interessantes que aparecem pra desenvolver melhor essa teia em volta de Albert são: Tommy Corn (Mark Wahlberg), Caterine Vauban (Isabele Huppert) e Dawn Campbell (Naomi Watts). Tommy é outro personagem que está sendo investigado por Vivian e Bernard. Ele é bombeiro e teria entrado numa crise depois do 11/09, e pediu a investigação deles por isso. O encontramos indagando sob os malefícios do petróleo, como guerras, miséria e ditaduras e tudo de ruim que isso causa no mundo. Ele chega ao ponto de se recusar a andar de carro, e só usa uma bicicleta pra se transportar, até mesmo no trabalho. Sua esposa o abandona levando sua a filha, porque não suportava mais as indagações existenciais do marido. Tommy é escalado por Vivian pra ser o “outro” de Albert. Ele ficaria sendo um amigo dele para lhe dar apoio no momento que este estivesse no momento de “abismo emocional”, recorrente do processo de investigação existencial. E Tommy fica muito amigo de Albert já que se identifica muito com ele. E como conseqüência Tommy apresenta para Albert, Caterine Vauban, uma rival de Vivian e Bernard, que vai ainda mais o influenciar na sua vida.

A participação de Caterine é muito importante no filme. Ela é uma escritora, que traz uma filosofia inversa ao de Vivian e Bernard. Enquanto os detetives defendem que tudo é importante e tudo está ligado no universo, ela já diz que nada importa, e as coisas acontecem de forma aleatória. Somos nada e temos que aceitar isso. O filme trabalha muito bem essa duas filosofias inicialmente opostas. Curioso é que, enquanto o método de Vivian e Bernard para que a pessoa enxergue sua própria realidade, consiste em simplesmente fechar os olhos e relaxar, o de Caterine usa uma bola que a pessoa vai batendo no rosto até fica inconsciente. Ou seja, um método faz a pessoa enxergar a si mesmo através da tranqüilidade, quietude, e a outra através da dor. E isso traduz bem como as duas filosofias são inversas. E é essa inversão que faz Albert cair num abismo emocional ao primeiramente aceitar a proposta de Vivian e Bernard, e depois a de Caterine, quando ela finalmente lhe explica o motivo de suas coincidências envolvendo o

cara africano. Ele vai do céu ao inferno em pouco tempo.

 

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Dawn Campbell entra na história por ser a namorada de Brad, ela é a garota-propaganda da Huckabees, e forma com ele o típico casal jovem, bonito e bem sucedido. Quando Brad pede uma investigação para Vivian e Bernard, para tentar sabotar Albert, ambos caem numa armadilha, já os detetives acabam por fazê-los ver o quão fútil era a vida que eles estavam tendo. Ele, por querer ter sucesso na vida, se anulava atrás de uma imagem de cara boa praça e simpático, e ela se anulava para parecer sempre bonita (desde o começo se nota que isso incomodava muito ela, já que em uma gravação de um comercial ela diz que não estava se sentindo muito bem). Primeiramente, é Dawn que cai nessa crise existencial e passa a se vestir de qualquer jeito, e cobrar mais seriedade de Brad, e logo depois é ele, que mesmo demonstrando uma certa resistência em aceitar a filosofia dos detetives, numa  uma conversa reveladora com eles, acaba falando a frase “Como eu não sou eu mesmo”, isso cai como um raio na cabeça dele. E o faz se sentir mal ao tentar manter o mesmo comportamento que ele vinha tendo no decorrer da vida. Ele vê o quanto estava vivendo em cima de uma imagem, e chega ao ponto de vomitar quando insistem para ele contar uma história que ele sempre contava e que era o que o ajudava a manter essa imagem. É lado emocional interferindo no lado físico.

Mas como Huckabees não é filosofia jogada ao léu. O filme se sustenta bem em cima delas, mas é antes de tudo uma comédia, com muitas cenas hilárias. Difícil citar todas, já que são várias no decorrer do filme, mas as cenas que Albert está inconsciente pelo método de Vivian e Bernard, e só enxerga Brad em sua mente. Como ele, furioso, sempre usa um facão para exterminá-lo, são ótimas. Outra cena é a que Albert indo até o endereço do cara africano, que descobrirmos aqui se chamar Steve, é outro ótimo momento do filme. Steve foi um órfão do Sudão adotado por uma família de classe média americana típica, com uma mãe religiosa que empurra sua crença para os filhos, incluindo Steve, que eles tratam como se fosse uma criança, e um pai conservador, que não se importa para questões ambientais, por pensar que isso bloqueia o progresso urbano. Tommy e Albert ao se deparar com essa família num momento onde os dois passam por essas questões existências rendem ótimos diálogos. E temos também as cenas das investigações de Vivian e Brad onde a todo o momento do filme eles podem aparecer, já que fica implícito que eles estão observando ou ouvindo o que está acontecendo (eles colocam microfones por toda parte). E o ótimo elenco dá a base pra tudo que o diretor quer trabalhar no filme. De todos eu teria que destacar Mark Wahlberg. Ele dá ao Tommy o tom certo de fúria e incertezas que a personagem passa no filme. Uma coincidência é que o Mark e o diretor David já trabalharam juntos em outro filme chamado Três Reis (Three King, 1999) que se passava na Guerra do Golfo, que ocasionou por toda a disputa de petróleo, que é o que o motivo da fúria do personagem do Mark aqui.

 

Para concluir, o filme acaba admitindo a possibilidade de ambas filosofias apresentadas aqui, não serem opostas ou excludentes, seriam sim, complementares uma à outra. O “Tudo” (Vivian e Bernard) não existiria sem o “Nada” (Caterine) e vice-versa. A conclusão dos problemas entre Brad e Albert mostra isso. Influenciado pela filosofia de Caterine, Albert chega à conclusão que para se livrar de Brad precisa fazê-lo passar por tudo que ele passou. Mas ao se vingar, ele vê Brad chorando e vulnerável, e isso o faz se identificar com ele. Ele se vê na tristeza do adversário. Através da filosofia de Caterine, Albert vê que a ligação das coisas do universo, que é a filosofia de Vivian e Bernard, que ele havia rejeitado antes. E a cena final também é interessante nesse sentido, onde Vivian, Bernard e Caroline estão juntos observando Mark e Albert. E é essa conclusão que Albert chega. Mas mais importantes que as conclusões que Albert ou qualquer um pode ter tido ao ver o filme, foi ter a certeza de ter acompanhado uma história rica e muito divertida com I Heart Huckabees.

 

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PRESTE ATENÇÃO: Na atuação de todos os atores, todos ótimos e nos diálogos interessantíssimos que sem muita força consegue fazer rir, e sem cair no pastelão ou caricatura. A trilha sonora também se destaca se encaixando bem na história do filme.

 

O QUE JÁ SE DISSE: “Muito Engraçado” New York Post; “De Longe a comédia mais engraçada do ano” Premiere Magazine; “Umas obra-prima do caos hilariamente controlada” Manohla Dargis - New York Times; “Sob a direção inteligente e maluca de Russel os ators fazem coisas inacreditáveis” Rolling Stone (frases que constam na capa do DVD)

PORQUE NÃO PERDER: Uma comédia existencial com uma história deliciosa e elenco idem. Vários momentos hilários que se conectam de forma brilhante.

DADOS DO DVD: Idiomas: Inglês 5.1 Dolby Digital, Espanhol 2.0 Souround e Português 2.0 Surround; Legendas: Inglês, Espanhol e Português; Formato de Tela: Widescreen Anamórfico 2:35:1 NTSC. Extras – Documentário de Produção de Huckabees; Cenas Excluídas e Estendidas; Tomadas Excluídas; Coisas Diversas que as Pessoas Fizeram; Comerciais e Publicidade. Vídeoclip Musical com Jon Brian de “Knock Yourself Out”

Eis, amigos, a boa resenha feita pelo Jailcante para o leve, quase descompromissado, filme do David O. Russel. Outro texto descritivo, extenso porém de leitura muito agradável em razão de sua espontaneidade e construção cuidadosa.

Reparem que o jailcante, em determinada passagem, ressalta a criação de canais de comunicação fácil entre o artista e seu público como essenciais para o cinema ou qualquer outra arte. Essa é uma verdade óbvia que os circuitos mais mainstream de Hollywood, com seus twist endings e quebra-cabeças em forma de película cada vez mais comuns, vêm esquecendo. O que vocês acham?

Post semanal autorizado.
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