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Forum Cinema em Cena

SergioB.

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Everything posted by SergioB.

  1. (288) Éric Rohmer está se tornando o meu cineasta favorito no ano. Conhecia seus filmes, gostava, mas não tinha me aventurado pelo seu cinema menos conhecido, e agora tô assim...flutuando...apaixonado por tudo. Aquele amor que tava na cara, na prateleira, pronto para ser degustado. Este "O Amigo da Minha Amiga", de 1987, é mais ou menos assim. Numa simplificação, quatro amigos, e troca de casais. Não é bem assim. Mas é quase isso. Não são exatamente amigos entre si. As duas mulheres acabam de se conhecer, tornam-se colegas, confidentes. Uma é uma profissional bem-sucedida, mas solitária; a outra é uma jovem estudante mais sexy e direta. A jovem tem um namorado, com quem não tem identificação de gostos. Por sua vez, ele mostra ter muita afinidade com a amiga recente da namorada. Ele tem um amigo galanteador, engenheiro, que pega todas, o arquétipo do homem perfeito, cuja a protagonista, solitária, sonha com, mas não consegue conquistar. É um bololô, um rebuceteio (essa palavra criativa do mundo lésbico). Em nenhum momento, se fala propriamente em traições, a modo latino-americano. São franceses demais para isso. O importante é discutir a equivalência entre amor e amizade entre homens e mulheres. Frequentemente, nos damos melhor com pessoas por quem não sentimos atração. Mas e se por acaso tentássemos? Tentássemos fazer dar certo com aquela pessoa, que estava na cara, na prateleira, esperando por uma oportunidade? E se essa pessoa estiver comprometida com alguém querido por nós? Além do texto excelente, como sempre, urbano, cotidiano, coloquial; as qualidades de montagem "espacial", em que cada transição é um lugar diferente, continuam me fazendo suspirar pela sua elegância e joie de vivre. Mas o grande destaque técnico aqui é o figurino, com as amigas e os amigos vestindo azuis, ou verdes, em peças trocadas. Se em uma festa, uma das amigas está de saia azul, e camisa branca; a outra está de camisa azul,e saia branca...Uma coisa muito sutil, e bela, nada forçado. E assume função dramatúrgica, uma brincadeira do ver. Um sinal de que estamos em uma comédia, uma comédia moral. Na única cena de sexo, corte para a copa das árvores tremulando. Como em "Call me By Your Name". Tudo lindo na França da classe média. Piscinas públicas, parque, museus, cafés, festas...A juventude é um sol. Ai, ai!
  2. Gente...Nem nunca tinha ouvido falar. Virou outra pessoa.
  3. (287) "N`um vou nem falar nada!!" Revi o marcante e importante "Plataforma", filme de 2000, do gênio Jia Zhang-Ke. Um filme que exige do espectador certo conhecimento histórico sobre a história política chinesa, pois uma coisa que ele não é, de jeito nenhum, é didático. Estamos em Fenyang, uma cidadezinha do norte da China (a cidade natal do diretor), no final dos anos 1970, quando o país atravessava uma transição importantíssima. Saía do horror da chamada Revolução Cultural, e na sua brutal política de enaltecimento dos ditames do Maoísmo, para, através da condução de Deng Xiaoping, abrir-se à reformas econômicas e à uma abertura cultural. No filme, acompanhamos um grupo estatal de teatro camponês, que se apresentava para o povo, glorificando as supostas conquistas de Mao Tsé-Tung. Vamos observando outros detalhes: a vida miserável da população, gente que nunca estudou, nunca viajou, não sabe onde é a Mongólia, as roupas todas iguais, retratos de Lênin e Stalin nas paredes do cinema, a ausência de eletricidade nas casas, a letargia rural...Porém, a coisa começa a mudar. A eletricidade chega, mais gente vai embora buscando redenção econômica, o grupo teatral recebe influências estrangeiras ( há uma cena linda de dança flamenca), e, pelo que entendi, seus integrantes precisam se reiventar, alguns abandonam o grupo pois não dá pra viver mais do soldo estatal, outros começam a usar jeans, e formam uma banda de rock, cuja música principal é "Plataforma" - uma canção com letra melancólica. Em outra canção, ao longo do filme, pergunta-se como aquela geração do início dos anos 1980 estará dali a vinte anos. O filme é de 2000, é a resposta. E a China, sem dúvida nenhuma, já estava muito melhor. A erradicação dos rumos da Revolução Cultural por Xiaoping deu certo. A China se abriu e se modernizou. Tiurou centenas de milhões da pobreza. Como eu sempre escrevo quando falo dos filmes iniciais de Zhang-Ke, o Brasil em 2000 ainda era mais rico do que a China. Basta consultar os números e termos noção do nosso desastre em matéria de crescimento nas duas últimas décadas. Em meio a demonstração da transformação chinesa, há uma história de amor platônico entre dois integrantes da trupe teatral, vividos pelos atores de sempre de Zhang-Ke, Hongwei Wang e Tao Zhao, hoje esposa diretor. É um filme muito inteligente, pois consegue evitar uma crítica afrontosa às duas realidades. Embora entendamos o contexto político, ficamos mais é sensibilizados por ver a população, a sociedade, ser sempre a principal vítima, dos desacertos de seus governantes. Como mostra o cartaz, foi preciso a China virar-se de cabeça para baixo.
  4. Mas mantém o cabelão, né? Dizem que ele é o destaque deste primeiro filme, com mais tempo de tela do que se estimava.
  5. (286) Só queria um filminho pra fugir da realidade que passava inacreditável embaixo da minha janela no dia de hoje, e caí com este "Justiça em Família", disponível na Netflix. Um filme de ação bem genérico, de vingança em prol da honra familiar, até que, no final, há um instante de ousadia narrativa. Porém esse lance de ousadia é completamente inverossímil, tanto que simplesmente adentra o campo do ridículo. Dá vontade de quebrar a tv. Nem "Uma Mente Brilhante" conseguiu forçar tanto a barra - tanto que conseguiu capturar o carinho das pessoas, e o levar ao Oscar de Melhor Filme em 2002. Jason Momoa é um astro. Ele tem algo de muito gostável na figura, de barba e cabelo grande, como yo. Não sei como ele sobreviveria sem esse visual. Mas em algum tempo será preciso, sob pena de ser sempre o mesmo em cena.
  6. (285) Minha homenagem mental a Jean-Paul Belmondo, falecido hoje aos 88 anos, foi rever "Pierrot le Fou", no Brasil, com o insólito título de "O Demônio das Onze Horas". Quando soube da morte dele, pensei no icônico final deste filme, lógico. Mas, depois, pensei foi no início. Com ele, fumando, e lendo na banheira para a filha. Aliás, por causa de sua boca, com aqueles lábios marcantes, toda cena de ele fumando caía bem para a câmera. Neste complexo filme de 1965, temos ele e Anna Karina revivendo um amor do passado, abandonando as famílias, abandonando a sociedade, fugindo de uma quadrilha de gângsteres, para se isolarem no sul da França, perto do mar e do sol. No caminho, pequenos roubos, uma cantoria na floresta, uma encenação política humorada da guerra do Vietnã, a acusação de tráfico de armas da França para a Argélia, e muitas, muitas pensatas sobre o cinema. É como se os personagens abandonassem a vida linear, familiar, socialmente organizada, e, semioticamente, literária, para viverem uma vida de cinema. Vida de cinema na qual há muita emoção, roubos, brigas simuladas em postos de combustíveis, musicais, traições, "uma garota e uma arma" ( a frase famosa de Godard: "Tudo que você precisa para fazer um filme é de uma garota e uma arma"!) e uma das mais maravilhosas cenas sobre a importância do som no cinema, quando Belmondo encontra o personagem de Raymond Devos no cais do porto. O que é aquilo? É um lacre aquela cena! Um profissional do som precisa ver essa cena todos os anos. Era o melhor ator do mundo? Não. Mas é a cara masculina da Nouvelle Vague. Isso é tudo. Bravo!
  7. (284) Vi o adolescente "Ele é Demais", de 2021, da Netflix. Uma atualização do megasucesso "Ela é Demais", de 1999 - que eu vi repetidas vezes naquele ano. Só que dessa vez a aposta é entre meninas, e o garoto é que será transformado. O filme em si é terrível. Muito mal dirigido, falso, superescrito. No campo moralista, acrescento, promove tudo aquilo que tenta denunciar, como a superficialidade, o consumismo, a vontade de status. Mas o pior são os atores. Todos bem ruins, a começar pela tik toker Addison Rae. O garoto é ruim, mas estraga menos as coisas. Kourtney Kardashian tem um papel ridículo, e está canhestra em cena. Deu dó ver Rachel Leigh Cook, estrela do filme de 1999, agora como a mãe da adolescente. Cruel, o tempo é cruel. Um filme pra atingir os novos adolescentes, os adolescentes de hoje. Pelo sucesso no streaming, devem ter conseguido. Já os antigos adolescentes cresceram e não gostaram, não.
  8. Dias para me inspirar com as vinhetas de "Nova York - A Vida na Grande Cidade". Reunião de várias obras do papa dos quadrinhos, Will Eisner - dono de enorme técnica, observação e sentimento.
  9. (283) Bale em "O Operário"; McConaughey em "Clube de Compras Dallas"; ou Michael Fassbender neste "Hunger", de 2008; que ator emagreceu mais? Deixe o seu voto. Estreia em longas de Steve McQueen, ganhou vários prêmios naquele ano, inclusive Un Certain Regard em Cannes, Los Angeles, Nova York, e por aí afora. É impressionante como primeiro filme. Muita virtuose desde já. E um desejo de mostrar o talento, que às vezes se mostra excessivo. Montagem excelente de Joe Walker, do aguardado "Duna". Dribla até onde pode a discussão política - o que, vamos ser sinceros, facilita o roteiro - sobre o que se passou na Irlanda do Norte, para centrar na violência institucional que os presos do Ira receberam na prisão, e como a violência também acertou o outro lado, dos policiais penais. O compasso é os Direitos Humanos. Fassbender (nu em pelo, antes de "Shame") merecia todos os prêmios do mundo, tanto pela sua entrega física, como também pela maravilhosa atuação, no incrível plano central do filme: Dezesseis minutos de discussão entre ele e o Capelão, sobre a natureza da greve de fome prestes a se iniciar. Martírio, suicídio, homicídio? Muito bem escrito, por sinal; num diálogo lindo, ora veloz ora reflexivo, cujo momento estampa o cartaz. No mundo real, o IRA foi dissolvido em 2005. A velha Albion encontra-se em paz internamente. A Irlanda, como um todo, nunca esteve tão rica ao adotar o liberalismo econômico (Aliás, percentualmente, mais rica do que os Estados Unidos). Imagino que a do Norte colha os frutos do processo, por derrame. Thatcher, a vilã do filme, por não reconhecer o status de prisioneiros políticos a verdadeiros terroristas, venceu. A palavra terrorista não aparece no filme. Mas eu a coloco nesse comentário, por amor à verdade.
  10. Segura, Coração: Dune – First Reactions: James Mottram: As absorbing as Dune’s plot is, it’s the world-building that will leave your mind blown. The costumes, the production design and the visual effects are all elite-level, perfectly harnessed to bring Villeneuve’s vision of Herbert thrillingly alive. Peter Howell: Desert power! Frank Herbert’s “unfilmable” sci-fi classic becomes transporting cinema in Denis Villeneuve’s capable hands. The film connects on visual and subconscious levels, demanding the biggest screen possible but also rewarding close study. David Ehrlich: DUNE is a *massive* disappointment. The cinematic equivalent of getting a novelty-sized check for six dollars. Hype is the mind-killer. Steven Weintraub: I know you’re used to people raving about a movie on social media after it premieres. But trust me when I say Denis Villeneuve’s Dune is a masterpiece not just of science-fiction but of cinema. Haven’t felt transported like that in a movie theater in a long time. Rafael Motamayor: DUNE feels like the pop culture event we were waiting for. The next Star Wars, the next Lord of the Rings or the next Game of Thrones. It’s here. It’s epic, but it is also just giddy FUN! Don’t let anyone tell you this is “Star Wars for adults,” as anyone can enjoy this story. Owen Gleiberman: Denis Villeneuve’s adaptation has a majestic vastness, and most of it actually makes sense, but it’s an act of world-building that runs out of storytelling steam. Dune is out to wow us, and sometimes succeeds, but it also wants to get under your skin like a hypnotically toxic mosquito. It does…until it doesn’t. Joel Meares: Dune is incredible. Sci-fi that feels as epic as anything we’ve seen, visually ambitious (and weird as f–k), and yet completely lived-in, visceral, and gritty. Set pieces that gave me I’m-a-kid-again chills. Top-tier performances and rich characters. Bring on Part 2. Steph Green: DUNE is eyeball-rattling, seat-shaking, sheer virtuosic spectacle, with a Zimmer score for the ages. Some heavy-handed dialogue & talky scenes felt flat, but that action? That cinematography? Ooh, baby! Ryan Weston: sweeping sci-fi spectacle of epic proportions. Its thunderous soundtrack, stellar performances and spectacular set pieces come together to create something truly special. And this is only the beginning. Clayton Davis: Dune is a visual spectacle. A new world is born for people like me, with no knowledge of the source material, and an achievement by Denis Villeneuve. Suspect Oscar noms in every tech category, director, picture. It opens with title card DUNE PART ONE. We better get PART TWO. Adam Solomons: Dune is fantastic and thrilling and provocative and strangely timely, too. Got my political brain working and my sci-fi bone going too. Really enjoyed it and I’m praying they’re able to finish the story with a sequel. Jazz Tangcay: Dune is spectacular. Denis Villeneuve has crafted a visual masterpiece. Greig Fraser’s cinematography is a sight to be seen,simply gorgeous. You can’t take your eyes off the screen. Timothée Chalamet is outstanding. Don’t be surprised by a crafts sweep
  11. (282) Vou ficar uns 15 dias na correria máxima, e acho que vou ter que lamentavelmente sacrificar o Cinema. Ou escolher umas coisas rápidas. Vi "Bethânia Bem de Perto", que tem um subtítulo, em algumas consolidações, como, somado", "A propósito de um Show". É de 1966, e trata-se da segunda entrada na carreira de Júlio Bressane. Um curta de documentário que acompanha os passos de Maria Bethânia, estouradassa, logo após sua estreia no Show Opinião. Nele vemos Bethânia na intimidade, cercada de músicos e amigos, como Jards Macalé, Wanda Sá, Rosinha de Valença, Suzana de Moraes, Anecy Rocha, conversando a respeito de música, e em tratativas contratuais para fazer shows na Europa. A parte mais engraçada é ela, muito menina, de cabelo curto, bebendo e fumando, e dizendo sinceridades como não aguentar a música do "Barquinho" ("Não gosto nem de ouvir que Barquinho exista"); ou falando que não conhece pessoalmente Roberto Carlos, mas que sabe que ele é uma boa pessoa, no entanto "Quero que Vá Tudo pro Inferno" é de uma pobreza total. Explicável àquela altura, era muito menina, recém-chegada da Bahia, gostava era de samba-canção, coisas antigas do rádio, não estava muito na onda da Bossa Nova ou da Jovem Guarda. É um doc filmado sobretudo em close. "Bem de perto" mesmo, para capturar o máximo da intimidade. Vale mais como curiosidade história, ou tietagem. Para mim, a obra-prima "O Desafio", de Paulo César Saraceni, é muito mais valiosa, pois registra inteiramente a performance dela no próprio Show "Opinião", incorporando-a à narrativa do próprio filme. Dos vários documentários sobre ela, o que eu mais gosto é "Música é Perfume", de 2005.
  12. Considerado "O melhor pior escritor do mundo", o inglês Somerset Maugham alcançou grande sucesso de público e crítica com esse seu primeiro livro, "O Pecado de Liza", recebido até com certo tom de escândalo. Um escritor que me ganhou no começo da juventude, com seus excelentes "O Fio da Navalha" e "Servidão Humana". Livro de sebo, cheio de vestígios, usado - Como eu gosto.
  13. (281) Da fase americana de Jean Renoir, "Amor à Terra"/ "The Southerner", de 1945, que rendeu ao francês sua única indicação ao Oscar de Direção. Adaptado de um romance, acompanha a história de uma pobre família de trabalhadores rurais, que inicialmente recolhe algodão em uma plantation, e depois decidem ter eles mesmos sua roça. Lá, enfrentam toda sorte de problemas, desde um vizinho truculento, até as dificuldades inerentes ao ciclo da natureza. Mas mantêm o sonho de progresso, e de união familiar acima de tudo. Não somos bobos, veio na onda do colossal "Vinhas da Ira", que é de 1940. Mas aqui sem socialismo. O adversário não é "o sistema", é o tempo, a Natureza. Não se pensa politicamente em nenhum momento a condição da pobreza rural. Reforça-se a mensagem do esforço, e do trabalho. A ética americana, portanto. Não a ética comunista. Dito isso, o filme é bem bonito, terno, delicado, amoroso. Daquele tipo no qual as marcações do tempo são as páginas do calendário. Vai nessa linha bem antiquada. Em certo momento, quando a família enfrenta uma grande escassez, caça-se um gambá. Eles o preparam, e na hora da mesa, a nobre esposa e mãe serve a ela e a filha por último, "pois são mulheres". Inclusive, depois do cachorro, que capturou o pobre do gambá! Fiquei de cara. O pai é vivido pelo ótimo Zachary Scott, que naquele ano também brilhou pelo excelente "Mildred Pierce"/"Alma em Suplício".
  14. (280) Filme de 1982 de Michelangelo Antonioni, último longa antes do derrame e da paralisia que o afastou dos trabalhos mais longos, "Identificação de uma Mulher" não é dos títulos mais queridos do diretor. Porém rendeu para a cinefilia a famosa "cena da neblina", que se dá no meio do filme. É uma cena no qual o protagonista diretor de cinema avança pela estrada enevoada, na qual não se dá pra ver um palmo à frente, e a sua companheira, o rosto lindo e misterioso que persegue para o seu próximo filme, tem um ataque de pânico com a situação, deixa o carro, e desaparece. A cena é lindamente filmada. E muito representativa da carreira do diretor, remetendo obviamente a "A Aventura". Um diretor recém-separado precisar achar um novo rosto para seu próximo trabalho. Um novo rosto lhe dará uma história. E um novo rosto, com suas qualidades únicas, pode ser também um reaquecimento para a sua vida real, solitária e presa ao pensamento. O filme tem quase uma divisão em duas metades. A primeira, de busca profissional pelo rosto e o romance com uma linda e enigmática mulher, que termina na cena da neblina. A segunda parte é ele em um novo relacionamento, com uma outra mulher. Menos bonita, mas mais real, mais possível, que talvez não renda um filme, que talvez não possa estrelar um filme, mas pode compartilhar com ele a vida. Por questão de estilo, o filme está recheado das costumeiras elipses do diretor. Fiz cara de "ué?", quando no começo do filme, antes mesmo do cara estar com a garota, já vem um "segurança" (de um mafioso) dizer a ele para não se envolver com a moça. Isso quer dizer que ela tem um passado perigoso, mas nunca ficamos sabendo realmente de nada. Também não vamos saber como o segundo romance começa, nem o contexto geral. Agora, tudo é tão bem filmado, que dá gosto de ver. Me chamou a atenção duas cenas de alto erotismo. Tipo, alto mesmo. Nível Bertolucci. Uma, mais romântica, com os amantes nus, brincando embaixo do lençol, jogando-o para cima. Outra, muito forte, um momento cuspe e ...um "fisting"! Sério, acho que nunca havia visto um "fisting" no cinema! Não neste cinema.
  15. (279) Em 2020, Hong Sang-soo levou o prêmio de Direção em Berlim pelo seu excelente "A Mulher que Fugiu". Neste 2021, mais um prêmio em Berlim, Melhor Roteiro, por este "Introduction". Tenho que ficar ligado, pois o homem não para, já filmou outro trabalho neste ano, e eu quero continuar com meu "status" de ter visto TODOS (uhuhu!!) os filmes dele, durante aquela extensa maratona da pandemia. Este filme é muito sutil. Quem não prestar atenção vai ficar sem entender nada. Acompanhamos um jovem ator em três momentos. Um, em uma visita a seu pai, um médico bem-sucedido. Dois, um encontro com sua namorada em Berlim, uma jovem estudante de moda, muito romântica, encantada por ele. Três, um encontro com sua mãe, e o namorado dela - um experiente ator - em um restaurante, no qual ele leva um amigo seu. O episódio mais importante é o 3. No qual sabemos que o jovem ator admite não ter vocação para aquela profissão, embora tenha um rosto bonito. Alega ele ter se sentido desconfortável em beijar uma mulher em cena, e que a namorada não gostou muito, mas principalmente ele se sentiu mal. A mãe e o companheiro dela ficam loucos ao ouvir aquilo, ao ver ele desistir tão facilmente da profissão por isso. Mas ele, na verdade, está dizendo outra coisa...Está, justificando o título, "apresentando" o namorado a mãe. Sim, sem dizer, está dizendo que é gay. Só fui me ligar que a primeira cena do filme é o pai dele, no consultório, rezando fortemente, dizendo a Deus que entregará parte de sua fortuna a um orfanato, mas não sabemos por quê. Descobriremos no episódio 3, quando os dois rapazes vão andar em uma praia, e o jovem ator é abraçado pelo outro, enquanto sua mãe vigia à distância da sacada de um hotel. O namoro com a jovem estudante é apenas uma fachada, e ela, ingênua, não percebe. Ainda desconhece o mundo, como admite em certo momento. Parando para pensar, me lembrei que em "A Mulher que Fugiu", seu filme anterior, também estruturado em 3, havia uma personagem lésbica não declarada, que vivia com a "amiga", afastada da cidade. Eu tenho certeza que 99% das pessoas não vão entender esse filme. Vão ficar com cara de "????". A coisa é muito sutil. Mas importante. Está falando sobre o peso que é ser gay na Coreia do Sul. O pai rezando desesperado, logo na primeira cena, é o mais indicativo. Está longe de ser o melhor filme dele. Mas, como sempre, o seu cinema está todo ali. Longas caminhadas com conversas prosaicas, estáticas, sem plano e contra-plano; um hotel, uma mesa de restaurante regada a muito soju...uma cena na praia... Uma cena na praia, deste vez, não à noite, não sozinho. Gostei muito.
  16. (278) "N`um vou nem falar nada!!" O meio dos anos 1990 teve os Estados Unidos mergulhados no caso O.J.Simpson. Eu lembro de achar um saco aquela cobertura de imprensa enorme, detalhista, de um atleta que eu não conhecia, mas o caso em si realmente nos instiga, sobretudo diante do surpreendente veredicto. David Lynch, a meu ver, traduziu perfeitamente o zeitgeist, de um país fissurado por um homicídio passional, em seu maravilhoso "Estrada Perdida", de 1997. O filme tem uma atmosfera incrível, seja com as luzes, seja na condução das atuações gélidas num modernizado noir, seja com a seleção musical incrível de Angelo Badalamenti (com direito a Insensatez, de Tom Jobim), mas é a montagem perfeita, dessincronziada, que faz o filme ser um mistério, um enigma - nem tão difícil assim de elucidar. Já há dezenas de explicações na Internet, mas eu gostaria de ressaltar um aspecto que é a motivação do crime. O personagem de Bill Pullman é um cara ruim de cama, frustrado sexualmente. Isso está claro no início do filme. Faz todo sentido então, ele, já preso, imaginar-se como um mecânico (uma das taras mais recorrentes do mundo do pornô), um jovem atraente, e que satisfaz amplamente na cama a - agora - em sua imaginação - "esposa" do gângster. Em sua imaginação, ele agora pode dar o troco, por ter sido traído em sua vida real. Em suma, devolver o chifre. Uma aula de cinema, e de entender o momento espiritual de seu país. Só escrevendo isto é que fui me dar conta do quanto este filme influenciou "Caché", do Haneke.
  17. (277) Quando registrei aqui meu ranking Luis Buñuel, lembro de ter ficado em dúvida sobre a posição 5, se "A Bela da Tarde", ou "Tristana". Coloquei o primeiro, mais icônico. Revi o filme de 1970,"Tristana"/ "Tristana, uma Paixão Mórbida", e titubeei. Tem muita coisa boa, mas principalmente seu último ato. Sempre aclamado por ser um belo exemplo de filme com inversão de papeis, o que mais celebro é a sutileza que a coisa se dá. Não é Chan-wook Park; é gradual e também, em outro aspecto, político: Os jovens se vingando da velha espanha franquista e autoritária. Fernando Rey, um atorzaço, está formidável como um homem áspero que recebe uma jovem orfã como um guardião e que aos poucos passa dos limites com ela ; um homem que odeia o casamento, a Igreja, a família, formalidades; para no final do filme sorver chocolate quente com os gananciosos padres de Toledo...E, ingenuamente, se casar (mesmo com a noiva vestida de preto). A Tristana de Catherine Deneuve é a bela virgem, vítima sexual; mas que dará o troco, se vingará, movida pelo ressentimento e pela inesperada ruína física. Indicado ao Oscar de Filme Estrangeiro em 1971. Um filme que veio de um romance "b", e que pelas mãos competentes do diretor, que driblou a censura da época, consegue se elevar a um status imenso. Só lamento não haver um animal em cena, posicionado surrealisticamente, dessa vez.
  18. Houve muita especulação humorística sobre qual título dariam a este filme no Brasil, e taí cristalizada a fixação por subtítulos genéricos. "Cry Macho" é de difícil tradução, realmente, seria algo como "Resmungão".
  19. (276) Tentei mais uma vez, mas não gosto mesmo de "A Maldição da Flor Dourada", de 2006. Parece uma tentativa exagerada de Zhang Yimou de repetir a mágica conseguida com os fabulosos "Herói", e "O Clã das Adagas Voadoras", dois dos mais espetaculares filmes em termos visuais que eu já vi. Eu simplesmente amo aqueles Wuxia. A beleza extrema tenta esconder a história desinteressante, muitas vezes já vista, de intrigas palacianas, envenenamentos, e de tomadas de poder na China Imperial medieval. Gong Li tem pouco a fazer, com seu personagem que revela tudo nos primeiros minutos. Passa o filme todo sem acrescentar nada. Indicado ao Oscar de Figurino em 2007. Meu ranking Zhang Yimou está assim: - Cerimônia das Olimpíadas de Pequim 2008 (O show mais bonito que a humanidade já fez) - 1) "Lanternas Vermelhas"; 2) "Herói" 3) "Tempo de Viver"; 4) "O Clã das Adagas Voadoras"; 5) "Sorgo Vermelho"
  20. (275) Tô in love com o cinema de Carlos Reichenbach, de quem sempre fui fã, mas desde o ano passado fui vendo os filmes mais antigos dele, e só aumentou minha admiração. Este "Audácia!", de 1970, foi filmado em conjunto com Antônio Lima, mas Carlão filmou dois dos três episódios que o compõem, e, claro, os dois mais cativantes para a minha mente. No episódio intitulado "Prólogo", ele faz uma espécie de curta documentário, filmando a Boca do Lixo, em São Paulo, que era a zona do meretrício, a zona boêmia, e a zona em que os cinestas paulistanos ( e de outras glebas) se encontravam para falar de cinema. Tem imagens de Saraceni, Glauber, dele mesmo, e ainda a documentação da filmagem de um filme de Maurice Capovilla (morto em maio deste ano). O que ele quer mostrar é os cineastas de então fazendo cinema no Brasil, mesmo remando contra a maré, que exigia chanchada, nudismo à toa, gangsterismo. Nisso, corta-se rapidamente para o segundo episódio, também filmado por Reichenbach, um episódio de ficção, no qual uma jovem cineasta está tentando rodar seu primeiro filme, justamente usando os lemas daquela turma: algo direto, "anti-intelectual", como ela diz, livre, e sem medo da censura. Quando o dinheiro inicial acaba, a cineasta será tentada por produtores a incluir em seu filme gangsterismo do sertão, e nudismo, pois é o que vende ingresso, o que dá retorno. Além de tudo, uma amiga da onça da Imprensa a desestimula, enquanto um puxa-saco maníaco [ spoiler] a mata. O terceiro episódio de Antônio Lima é também a tentativa ficcional de se rodar um filme. Mas não um filme crítico como o da cineasta acima. Um filme tal qual se fazia aos montes naquela época: machista, retrógrado, no qual os produtores, o diretor, e o fotógrafo, usam as mulheres que anseiam em aparecer na tela grande, fazem teste do sofá com elas, tudo bem misógino, podre, e sem consciência de cinema. Do nada, há uma bandinha estilo Jovem Guarda, no cenário, cantando uma música fuleira. Uma ironia aos filmes bobos de Roberto Carlos. É um filme, portanto, que imita o que se fazia à epoca. "Audácia!" não é muito bem concebido, falta dinheiro, falta apuro técnico. Mas é muito instigante. E desafia a censura de frente. Os cineastas em dado momento discutem como vão se livrar da - usam a palavra - Censura, ao rodarem uma cena de sexo, e prometem dar um jeito. Audacioso!
  21. (274) Filme mais fraco que eu já vi do húngaro István Szabó, "Atrás da Porta", de 2012, é uma dramédia sobre o relacionamento entre uma escritora iniciante e uma empregada doméstica mais velha, ranzinza, cheia de peculiaridades e traumas de guerra. O texto é formulaico, noveleiro, e meio cafona, mas o pior é ver a atuação da Helen Mirren. Sinceramente, eu acho que ela atua mal em muitos filmes. Estou longe de achar que ela é uma atriz impecável, por mais que ela sim já esteve realmente digna do adjetivo em "A Rainha", "Gosford Park", e "As Loucuras do Rei George". Às vezes dá pra notar um fingimento técnico em seu rosto, algo automático, e não emoção de dentro pra fora. Não tem nada na direção que me chame a atenção, e estou falando de um cara que fez "Mephisto" - aquela coisa!! E o pior é que o filme tem muito pouco a dizer sobre o horror que os húngaros passaram na Segunda Guerra, ou muito pouco a dizer sobre o sabido colaboracionismo com os nazistas por parte da população. Muito ruim.
  22. Pois é. Eu o posterguei até conseguir encontrar e ver o original. Agora perdi a vontade. Risos.
  23. "O deus das avencas" é o novo livro do talentoso Daniel Galera, reunindo 3 novelas muito diferentes que prometem mostrar a criatividade e o crescimento literário do autor. Eu amo os livros dele! Meu Ranking Daniel Galera: 1) "Barba Ensopada de Sangue"; 2) "Mãos de Cavalo" 3) "Até o Dia em que o Cão Morreu"; 4) "Meia-Noite e Vinte"; 5) "Cordilheira"
  24. (273) Decepção enorme para mim! Sempre quis ver "Longe Deste Insensato Mundo", de 1967, feito pelo genial John Schlesinger, diretor de filmes extraordinários, como os posteriores "Perdidos na Noite", "Domingo Maldito", e "Maratona da Morte". É uma adaptação de um romance de época, do inglês Thomas Hardy, e conta com um elenco formidável: Julie Christie, Alan Bates, Peter Finch, e Terence Stamp. Ou seja, tinha tudo para ser bom, mas é maçante e "estranho". Segundo a conhecida sinopse, trata-se de uma bela jovem, que herda uma fazenda de um tio, e passa a comandá-la sozinha, com sua luminosa personalidade e carisma. Tais predicados conquistam a todos, e ela passa a ser cortejada por 3 homens: Um nobre detentor de muitas terras; um soldado cafajeste; e um agricultor de alma nobre. Tal como na Inglaterra do Século XIX, ou no Brasil do século XXI, é claro que ela faz a escolha errada. É um romance de época mesmo, não dos dias de hoje. A protagonista vira uma boba, uma otária ao longo do filme. Não dá pra acreditar. É justamente o caminho oposto do que se faria hoje: da dependência à independência. Seria até curioso testemunhar uma jornada inversa, fora do nosso habitual de "lacração", mas são quase 3 horas de decisões tolas, para, no final, haver algum regozijo. Tudo é muito estranho, e repentino. As coisas mais importantes acontecem em 2 segundos, e acabou. Dá-se um corte para a etapa seguinte. O filme tem algumas movimentos de câmera ousados, como trocar as lentes, para grande angulares, no momento em que os personagens se embriagam e ficam tontos. Mas nada demais. Um épico de fazenda, cujas decisões românticas são difícieis de aceitar, no qual foi eliminado qualquer teor de avanço social, depois dos primeiros 20 minutos. A liderança feminina esvazia-se em nome de um amor, que nunca, jamais, é necessário, para uma mulher.
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